O presidente dos juízes

Ontem, no Rio de Janeiro, foi lançada a candidatura do juiz maranhense Gervásio Santos à Presidência da Associação dos Magistrados Brasileiros. É a principal associação dos juízes. Reúne mais de dez mil juízes, a grande maioria na ativa, mas centenas de aposentados também.

As eleições serão no fim do ano. Mas a campanha já começou. Vai haver disputa. O outro candidato é o desembargador Henrique Calandra do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Se o Ministro Cezar Peluso é o Presidente do Judiciário no Brasil, o presidente da AMB é o Presidente dos juízes do Brasil. Não tem nenhum poder, mas tem grande influência. Não tem voz própria, mas tem voz representativa. Será necessariamente ouvido, interlocutor obrigatório.

É associação profissional das mais poderosas no Brasil, sobretudo porque cresce o poder do Judiciário nas decisões da vida brasileira. É quase relação de causa e efeito.

Na verdade, é preciso distinguir a estrutura legal do Judiciário de sua estrutura política. Naquela é a hierarquia que comanda, nesta as alianças e negociações são decisivas. Naquela a governabilidade depende dos tribunais, nesta dos acordos e desacordos, convergências e divergências entre o presidente do Supremo – CNJ, Ministro Cezar Peluso e seu vice Carlos Ayres Britto, o Corregedor Geral da Justiça Ministro Gilson Dipp, o presidente da AMB, atualmente Mozart Valadares, o Presidente do Colégio dos Presidentes dos Tribunais de Justiça, Marcus Faver, e o congressista que em geral lidera os assuntos concernentes ao Judiciário no Congresso, deputado Flávio Dino, do Maranhão.

Esstes líderes, ao lado do Presidente da OAB Ophir Cavalcanti, do Procurador Geral da República Roberto Gurgel Santos e do Advogado Geral da União Luís Adams, integram a cúpula política da administração da Justiça.

Essa cúpula tem mudado e deve mudar ainda mais este ano. Min. Cezar Peluso já substituiu Min. Gilmar Mendes. O mandato do Corregedor Geral Min. Gilson Dipp termina e poderá ou não ser renovado. O deputado Flávio Dino não volta ao Congresso, pois concorre ao governo do Maranhão. E agora sai Mozart Valadares e entra ou São Paulo, com Desembargador Henrique Calandra, ou Maranhão com Gervásio Santos.

Quais os temas divisores em torno dos quais a campanha entre os juízes pode se desenvolver? Como toda associação representativa de interesses profissionais, a pauta é, sobretudo, voltada para os eleitores, os próprios magistrados.

De uma forma latente, tema recorrente é a influência de São Paulo nos destinos da administração da Justiça. Não somente porque representa às vezes mais de 30 % do movimento do Judiciário Brasileiro, mas também porque, hoje, o Min. Peluso veio do Tribunal de Justiça de São Paulo, e o Desembargador Calandra também terá vindo de lá.

O TJ São Paulo acredita que seus problemas são distintos dos problemas dos tribunais do resto do país, além da endógena pretensão de merecer maior autonomia. Ser muito é ser mais.

O segundo tema voltado aos eleitores é sempre o de assegurar novos patamares de remuneração aos juízes. Não é por menos que em seu discurso de lançamento de candidatura Gervásio Santos defende a aprovação da PEC 46/08 que concederia aposentadoria com proventos integrais aos magistrados.

Outro vetor será a posição diante do Conselho Nacional de Justiça. As divergências são mais nítidas. Os juízes de primeira instância já percebem o CNJ como um locus capaz de defender seus direitos individuais, tal como assim o percebe a sociedade.

Já os tribunais, sobretudo as diretorias dos grandes tribunais como Rio de Janeiro e São Paulo, gostariam de reduzir a competência constitucional de controle que o CNJ exerce sobre eles. Haja ver a reação da semana passada ao levantamento feito pelo CNJ sobre o excesso de cargos de confiança em vários tribunais, neutralizando o comando constitucional do concurso público.

O paradoxo é que a influência dos juízes na sociedade, e da AMB sobre a governabilidade do Judiciário, dependerá muito de como a sociedade perceba nítidos ganhos de eficiência da gestão e ampliação do acesso a justiça. Ou seja, a pauta interna de campanha dos juízes pode se chocar com a pauta externa da sociedade que legitima a magistratura. Como conciliá-las?

Joaquim Falcão escreve quinzenalmente neste Blog