SUS X PLANOS DE SAÚDE: STF decide 20 anos depois, mas não resolve de vez. Só 50% e passa a bola, os outros 50%, para o STJ.

O artigo 196 da Constituição Federal diz:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Convenhamos que a amplitude é muito grande e sempre faltarão recursos. Até por isso os recursos existentes devem ser administrados com racionalidade, seriedade e justiça. Foi com essa ótica que o então Ministro Adib Jatene no século passado, diante de fatos do dia a dia, qual seja, pessoas que possuem plano de saúde, principalmente nos casos de urgência e emergência, serem atendidos na Rede do SUS, sem que este fosse ressarcido, propôs o art. 32 da Lei nº 9656/1998 que diz:

Art. 32.  Serão ressarcidos pelas operadoras dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, de acordo com normas a serem definidas pela ANS, os serviços de atendimento à saúde previstos nos respectivos contratos, prestados a seus consumidores e respectivos dependentes, em instituições públicas ou privadas, conveniadas ou contratadas, integrantes do Sistema Único de Saúde – SUS.      (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001)

Por essa razão, a ANS estabeleceu que o SUS deveria obter, pelo menos, o nº do CPF de cada paciente. Através dele a ANS saberia se aquele paciente tem ou não plano de saúde. Se tivesse, cobraria do plano respectivo os serviços prestados pelo SUS, fixando o preço pela tabela SUS mais 50% (preço muito abaixo dos preços de mercado) e depositaria na conta do Fundo Nacional de Saúde que, em seguida, repassaria a quem prestou o serviço.

No papel, esse sistema é ótimo, mas na prática não funcionou por alguns motivos.

O primeiro porque a Confederação Nacional de Saúde – Hospitais, Estabelecimentos e Serviços (CNS) entrou com ADIN junto ao STF questionando a regra e os preços cobrados pela a ANS. E, também,  recomendou aos seus associados que não pagassem e questionassem na Justiça cada cobrança. Se quisessem, depositassem os valores para ao final do litígio, caso perdessem, o dinheiro já estar disponível.

O STF, com a sua lerdeza característica levou VINTE anos para julgar a ADIN. Finalmente disse que a cobrança é constitucional, mas sobre o valor cobrado pela a ANS disse não ser competência sua, mas do STJ. Convenhamos que não é esse Supremo que nenhum cidadão brasileiro quer e deseja. Aliás, creio que nem os próprios Ministros. Lento e desligado dos problemas do dia a dia.

Vejam o release do STF:

Ressarcimento

Os ministros declararam ainda a constitucionalidade do artigo 32, caput e parágrafos, que prevê o ressarcimento, por planos de saúde, de despesas relativas a serviços de atendimento aos consumidores, previstos nos contratos prestados por entidades do Sistema Único de Saúde (SUS). Conforme o relator, a regra não implica a criação de nova fonte de receitas para seguridade social, nos termos do artigo 195, parágrafo 4º, da Constituição Federal, mas sim desdobramento da relação contratual firmada em ambiente regulado.

O ministro destacou que o tratamento em hospital público não deve ser negado a nenhuma pessoa, considerada a universalidade do sistema. Porém, observou que, se o Poder Público atende a particular em virtude de situação incluída na cobertura contratual, deve o SUS ser ressarcido tal como faria o plano de saúde em se tratando de hospital privado. “A norma impede o enriquecimento ilícito das empresas e a perpetuação de modelo no qual o mercado de serviços de saúde submeta-se unicamente à lógica do lucro, ainda que à custa do erário”, concluiu.

Repercussão geral

O Plenário julgou ainda na sessão de hoje o Recurso Extraordinário (RE) 597064, com repercussão geral reconhecida, no qual se fixou tese sobre o tema do ressarcimento dos procedimentos prestados pelo SUS. A Corte desproveu recurso interposto por uma operadora de plano de saúde (Irmandade do Hospital de Nossa Senhora das Dores) contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) que julgou válida cobrança a título de ressarcimento do SUS por atendimentos prestados a beneficiários do plano.

A tese proposta pelo relator do RE, ministro Gilmar Mendes, e aprovada por unanimidade, reconhece a constitucionalidade da regra e afirma o direito das partes ao contraditório e à ampla defesa na esfera administrativa: “É constitucional o ressarcimento previsto no artigo 32 da Lei 9.656/1998, o qual é aplicável aos procedimentos médicos, hospitalares ou ambulatoriais custeados pelo SUS e posteriores a 04/06/1998, assegurados o contraditório e a ampla defesa no âmbito administrativo em todos os marcos jurídicos”.

O julgamento também rejeitou argumento trazido no recurso no qual se tentava determinar como referência de preços dos ressarcimentos a tabela do SUS para os procedimentos, e não a tabela fixada pela Agência Nacional de Saúde (ANS) na Tabela Única Nacional de Equivalência de Procedimentos (TUNEP). Segundo o argumento adotado pelo Plenário, trata-se de tema infraconstitucional.

Ou seja, o assunto não está resolvido. O que se espera agora é que o STJ não leve mais VINTE anos para decidir o assunto. Aliás, por questão de Justiça, registre-se que o STJ tem sido bem mais célere do que o STF. Manda o bom senso que esse assunto seja priorizado.

E quando isso ocorrer sobrará uma questão que é reclamação de todos os governadores e prefeitos do Brasil inteiro, qual seja o caminho de volta do dinheiro. No início de 2015 os governadores pleitearam que a lei seja mudada para que ao invés do recolhimento ser para a ANS que fosse direto para o Estado e/ou Município que prestasse o serviço. A ANS não concorda, mas aí é outra discussão que ficará para os eleitos em outubro próximo.