Prefeitos tomam posse hoje e se queixam de dívidas

De OGLOBO.COM por Isabel Braga:

  • Eles também reclamam da falta de informações sobre municípios

BRASÍLIA, CAMPO GRANDE E FLORIANÓPOLIS — A maioria dos 5,5 mil prefeitos que tomam posse nesta terça-feira tem em comum, além da tarefa de pôr em prática as promessas assumidas em campanha, um problema a enfrentar: as dificuldades financeiras que atingem a grande maioria dos municípios brasileiros. Dívidas que rolam há anos, novos gastos e contratações feitas pelo antecessor às vésperas de deixar o cargo, além da falta de pagamentos, o que leva a situações como a interrupção da coleta de lixo e a dificuldade de obter os dados reais da situação financeira dos municípios.

É um drama que atinge os eleitos dos mais diversos partidos, indiscriminadamente. Nas 26 capitais, apenas quatro prefeitos se reelegeram. Em todo o país, segundo o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, foram 1.509 reeleitos.

Gustavo Fruet, do PDT — que derrotou o atual prefeito de Curitiba —, diz que a dívida do município deverá ser pelo menos três vezes maior do que os R$ 130 milhões divulgados pela atual administração; muitos fornecedores estão há seis meses sem receber. Ele afirma que, pela primeira vez, tem perdido noites sem dormir.

— Isso porque fico imaginando se, ao final da minha gestão, vou deixar a cidade assim para meu sucessor.

Em Campo Grande, o advogado, radialista e deputado estadual Alcides Bernal (PP) assumirá a prefeitura da capital de Mato Grosso do Sul já em litígio com a Câmara Municipal, onde já sofreu derrotas. O projeto do IPTU 2013 foi enviado pelo atual prefeito, Nelson Trad Filho (PMDB), prevendo a correção dos valores em 5,31%, o correspondente à inflação acumulada no ano. Os vereadores, porém, decidiram congelar o imposto, alegando que isso havia sido a promessa de Bernal na campanha. Mesmo contra a vontade de Bernal, os vereadores aprovaram o aumento do salário dele de R$ 15 mil para R$ 20 mil.

O prefeito eleito não queria o reajuste para não onerar as despesas com pessoal, já que isso implicará na majoração dos vencimentos dos ocupantes de cargos no alto escalão. “A maioria dos vereadores (…) provavelmente vai querer engessar e boicotar a nossa futura administração, aprovando emendas que aumentam despesas e reduzem de 30% para 5% a suplementação orçamentária ou condição para bem administrar. Tudo por pura e egoística vontade de impedir uma futura boa administração”, reclamou no Facebook.

Novos prefeitos acenam com cortes

Em Florianópolis, o prefeito eleito, Cesar Souza Júnior (PSD), pretende começar seu segundo dia no comando da cidade, amanhã cedo, com uma reunião com funcionários da empresa de limpeza e coleta de lixo. Uma das primeiras ações prometidas é cortar o número de funcionários comissionados (em torno de 700) e fazer uma reforma administrativa com redução do número de secretarias, segundo ele para dar maior capacidade de investimento da prefeitura, que hoje não passa de 9% do orçamento anual.

Souza Júnior conseguiu na Justiça impedir o pagamento em cota única do IPTU, que venceria amanhã, para que seu antecessor, Dário Berger, não usasse a verba para fechar suas contas.

Em Belém, o tucano Zenaldo Coutinho (PA), também diz estar ciente de que as dificuldades financeiras são grandes, mas que não recebeu, na transição de governo, maiores detalhes sobre a situação financeira. Segundo ele, houve aprovação de planos de cargos e salários para algumas categorias de servidores no segundo semestre de 2012. Em sua primeira análise do Orçamento de 2013, não há previsão para esse aumento. Ele pretende iniciar o governo cortando gastos.

— Eu sei que o abacaxi é grande, mas nada que não seja superado com controle de gastos. Em 2 de janeiro publicarei decreto de redução de cargos em comissão, redução de contratos. A estratégia é gastar menos no governo para gastar mais com a população. Também no dia 2, entro pesado com equipamento e homens para garantir limpeza pública e Saúde — disse Zenaldo:

Prefeito eleito de Maceió, Rui Palmeira (PSDB) também reclama do fato de que informações essenciais não foram repassadas pela gestão anterior. A primeira preocupação, diz o tucano, será quanto à limpeza e à iluminação na orla da cidade, que nesta época tem um fluxo grande de turistas. Mas o foco principal será na melhoria da Saúde. Para tentar garantir boa gestão, ele fará cortes nos custos e reverá contratos.

— Precisamos dar mais eficiência à gestão. E vamos buscar ajuda federal. Depender só do recurso do município, não dá, e o governo do estado não tem capacidade de ajudar.

Para o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, as reclamações dos novos prefeitos são pertinentes, mas deverão ser feitas de novo daqui a quatro anos:

— O problema é do modelo, não apenas do atual gestor. É uma crise estrutural que torna as gestões um verdadeiro caos, pois o pacto federativo não é feito.

Segundo Ziulkoski, do bolo tributário brasileiro, 6% são arrecadados pelos municípios. Esse percentual cresce para 15,5% com as transferências obrigatórias de estados e da União. Outros 6% são repassados por meio de parcerias com programas federais, para ele a maior fonte de corrupção. Ao todo, diz, são 393 programas federais, como o Merenda Escola e o Bolsa Família, que exigem dos municípios contrapartidas que muitas vezes não podem ser dadas.

— Por exemplo, o programa de construção de creches. O governo dá recursos para a construção. O prefeito constrói, mas não tem recursos suficientes para garantir o custeio da criança na escola. Chamam o município para ser parceiro, mas como um prefeito pode fazer? — diz Ziulkoski.

Segundo Ziulkoski, em agosto deste ano, 2,5 mil municípios já estavam com meses de atraso no pagamento de empresas contratadas porque não queriam deixar de atender à Lei de Responsabilidade Fiscal.

— São muitos os conselhos para os que irão assumir: reduzir o número de secretários, usar pregão eletrônico, ver o custeio da administração e não se preocupar com a reeleição, mas com a administração nestes quatro anos.