Pedro Eugenio fora de perigo

pedro_eugenioO deputado Pedro Eugenio, do PT de Pernambuco, economista dos mais capazes, sofreu um aneurisma da aorta e foi socorrido às pressas. Somos amigos desde o tempo em que militamos no movimento dos economistas nos anos 80. Ele sempre foi dedicado, mas ao mesmo tempo bem humorado.

Superado o problema, escreveu em seu Blog – http://pedroeugenio.org.br/blog/ – CRONICAS DA SALVAÇÃO em que relata tudo o que viveu.

Vale a pena ler abaixo.

CRÔNICAS DE SALVAÇÃO

Equipes e Equipes

Era mais ou menos 9h30 da manhã da terça-feira, dia 4 de maio. A reunião programada para discutir o MEI com os prefeitos pernambucanos na sede de sua entidade, a AMUPE, parecia estar irremediavelmente comprometida. Cortes inesperados no FUNDEB haviam deixado os prefeitos furiosos. Rapidamente decidimos mudar os rumos da programação. O Valdir Pietrobom – presidente da Fenacon que tinha vindo do Paraná para mostrar a importância de todas as prefeituras aprovarem leis regulamentando o Simples Nacional e decretos regulamentando o Empreendedor Individual não falaria. Eu faria uma breve saudação sobre o MEI, o presidente Antônio Dourado também e, rapidamente, a pauta se voltaria para o problema do Fundeb. Paciência, o debate sobre o MEI ficaria para outra hora. Afinal esta ação pode garantir benefícios tributários e previdenciários a cerca de 11 milhões de micro empreendedores autônomos, hoje clandestinos.

Naquele momento, quando eu falava da importância dos contabilistas, citando o Valdir, a Alba Rosa – presidente do Sescap-Pe, também presentes e saudando Dourado e demais prefeitos, senti uma dor profunda na garganta, do lado esquerdo, irradiando para baixo. Para surpresa de todos informei que estava passando mal e não poderia continuar. Baixei o microfone sobre a mesa e me recostei na cadeira. No que diz respeito à reunião estávamos aos dois minutos do primeiro tempo. Quanto à minha vida talvez no último minuto da prorrogação.

INSTINTO PROFISSIONAL

De onde estava tornara-me espectador de minha própria agonia. Olhos se cruzaram. Alba e Rosana passavam-me incredubilidade – certamente aquilo não estava acontecendo. Mas vi, na primeira fila à direita, Carlos Evandro, prefeito de Serra Talhada, naquele momento incorporando em si o que há de melhor na medicina – presteza, atenção, dedicação. Ele literalmente pulou da cadeira e correu até onde eu estava. A partir daquele momento uma sucessão de fatos iriam ocorrer. Como se houvesse uma orquestração, todos ajudando, todos contribuindo para que a partida não terminasse para mim ali ou logo depois.

DECIDIR

As pessoas decidiram e rápido. Não só a equipe médica que iria me atender meia hora depois, mas todos em volta. Evandro me deitou imediatamente – medida absolutamente essencial. Minha assessora Rosana e ele decidiram ser melhor colocar-me no meu carro do que esperar por uma ambulância. Ganhamos – estimo- uma meia hora com esta decisão devido ao engarrafamento reinante entre a av. Recife e a Abdias. Muitos outros devem ter discutido e ajudado, mas o comandante Carlos Evandro bateu o martelo. “Vamos no carro do deputado”. Me levaram deitado, outra medida fundamental. Há quem pense que uma autoridade constituída não pode ser fotografada deitada. E preferem arriscar suas vidas. Fui deitado, lembro-me de Evandro e Gervazio me levando, mas tinham umas seis pessoas ajudando. Fui instalado no banco de trás do meu carro, cabeça no colo de Evandro. Ali sua função passou a ser a de me acalmar – “ia dar tudo certo, eu teria que cuidar melhor da saúde”, etc.

Neste momento assumem o comando dois novos atores. Minha assessora Rosana e meu motorista Cláudio. Ele costurando como ninguém vielas e atalhos e ela ligando para meu escritório preparando minha recepção no Hospital Português. Aonde vamos, ao hospital mais próximo ou ao mais especializado? Por incrível que pareça eu havia estado duas vezes no Hospital Português nos últimos dias, inclusive na véspera. Fazendo exames solicitados por minha cardiologista de São Paulo que, entre outras coisas queria monitorar discreta dilatação da aorta. Os exames estavam no carro. Eu os levaria comigo à Brasília no vôo das 11h30 chegando ao DF às 15h. De lá iria para a consulta em SP na quinta, dia 7.

“Vamos para o Português”, decidi. No volante Claudio decidia – uma decisão a cada instante – sobre os melhores roteiros alternativos. Surge um guardião da Polícia Militar em uma moto. Rosana grita – há uma vida a ser salva e ele assume a condição de batedor – quem é este soldado que entre seguir seu roteiro escolheu salvar uma vida? Meia hora depois chegávamos ao Português. Os telefonemas de Rosana haviam levado à Mary, Arthur e Carminha, em nosso escritório, a tomarem todas as providências necessárias. Um médico da equipe, que agora não me recordo o nome, me faz as primeiras perguntas e observa não estar achando batimento em minha perna direita. Logo chegam o Dr. Carlos Moraes e o Dr. Claudio. Eu informo que já não sinto os pés. E que havia feito exames cardiológicos recentemente ali mesmo. “Mande buscar”. Rosana simplesmente os entrega, pois Cláudio, no meio daquela confusão toda, não apenas dirigira, mas estava ligado em tudo e ao chegarmos ao hospital apanhara os tais exames e levara-os para o teatro de operações.

Rapidamente aqueles experientes profissionais que há mais de vinte anos constroem no Recife, centro cardiológico de expressão mundial, tomam uma decisão. Dr. Carlos olha pra mim que continuava na cama da emergência, e às vistas de minha mulher, diz: “o que você teve é gravíssimo. Temos que agir muito rapidamente. Vamos fazer uma tomografia para mapear tudo e vamos para o bloco cirúrgico.” E fuzilou com tranquila, porém firmíssima determinação. “Neste caso não há tempo sequer para a família discutir”. Perante tanta segurança e firmeza senti-me muito tranquilizado. “Vamos em frente” , respondi. Ao que parece haveria prorrogação. Eu estava muito tranquilo. Querendo muito viver, mas com uma sensação estranha de estar preparado para morrer. Quando, há quase 40 anos atrás estive face a face com a morte nas dependências do DOI-CODI, não senti esta tranquilidade.

Quanta coisa muda em quarenta anos na vida da gente! Eu via um general em ação. Assim me pareceu o Dr Cláudio, disparando comandos à equipe de enfermagem na preparação da operação. Ele sabia como ninguém que de cada 100 acometidos com rompimento de aneurisma da aorta, se nada for feito, haverá um óbito por hora. Após um pouco mais de quatro dias, todos estariam mortos. Porque muitos se salvam? Porque são operados a tempo. Daí a pressa, impossível prever quanto tempo eu suportaria. As pernas dormentes certamente mostravam que não teríamos muito tempo. Levam-me a centro cirúrgico. Muitos procedimentos pré-operatórios foram deixados de lado. Era tudo ao nada. Alguém me diz, “o anestesista já te deu uma dosagem para você dormir. Ainda tive tempo de uma última brincadeira: “pois aumente a dose pois não estou sentindo nada!” Um segundo depois, entrei em sono profundo.

É UMA GUERRA – EQUIPE MÉDICA EM AÇÃO

Falei no texto anterior, do sentido de equipe que dominou a todos à minha volta quando estava em curso socorrer-me. Naquele momento o objetivo era fazer-me chegar ao Hospital Português a tempo da equipe de Dr. Carlos Moraes poder me operar. A equipe de que eu falava, então, era em sentido mais amplo, algo parecido com a solidariedade em cascata que se vai acumulando quando é dado às pessoas – muitas anônimas – poderem ajudar alguma causa meritória. Lembro-me do soldado PM que virou batedor e ajudou-me a chegar mais rápido ao Português.

Mas agora falo da equipe médica de cirurgia cardiológica do Hospital Português comandada pelo Dr. Carlos Moraes e assistido pelo Dr. Cláudio Gomes e que tem outros gigantes – apesar de sua evidente humildade – como Dr. Fernando Moraes que comanda a equipe de transplantes cardiológicos, Drs. Fernando Figueira, Cristiano Bernardo (que ficou 72 h sem ir para sua casa, acompanhando-me no momento mais crítico do pós-operatório, e Euclides Martins Tenório).

Falo de dezenas de paramédicos, enfermeiros e enfermeiras e seus auxiliares que passei a senti-los como parte de minha família. Falo dos profissionais de fisioterapia respiratória. Falo de gente que vira a noite, que se desdobra com a competência de quem faz parte de uma das mais importantes equipes de cirurgia cardiológica do mundo, mas que não perde o sorriso nos lábios, uma palavra amiga. Na operação estiveram os Drs. Carlos, Claudio, Cristiano e Euclides , além do anestesista Dr. Antônio Silvino, e mais três auxiliares.

O destino testou esta equipe comigo em situação particularmente arriscada em procedimento de emergência, a aorta rompida, não nos restava muito tempo. Liga-se o sistema circulatório a uma máquina que assume o papel bombeador do coração. O coração pára. O ponto de rompimento da aorta, artéria que leva o sangue do coração para todos os órgãos do corpo humano é seccionado – cinco centímetros são retirados e substituídos por um tubo sintético.

Seis horas se passam, a família e os amigos na maior torcida. Não foram feitos exames de rotina que são realizados nas cirurgias eletivas. É como em uma guerra. A ordem é salvar vidas. Então, se não há tempo para os exames, vamos em frente!

Dr. Carlos Moraes está no comando, secundado por Dr. Cláudio Gomes. Décadas de experiência se acumulam em suas mãos, em seus conhecimentos, em seus sentimentos. Lembram-se da história da contratação de entrosamento, piada antiga que circula no futebol pernambucano? Pois bem, esta dupla (um alvirrubro e um rubro-negro) já havia “contratado” o tal craque há tempos. Na labuta diária, em incalculáveis horas de cirurgia, em desenvolvimento de técnicas novas.

Após seis horas de operação, um passarinho me contou que o Dr. Carlos teria olhado para o Dr. Cláudio e dito, “amigo, demos um show”. Fico pensando no significado destas palavras… Para além da técnica, quando estes homens e mulheres “dão show” significa que estão salvando vidas.