Ouvido de Mercador!

Por Marcelo Ramos:

Impressiona-me o cinismo com que os políticos reagiram às manifestações da última semana. Discursos de solidariedade e de comprometimento com as reivindicações contrastam com a total inércia no que diz respeito às mudanças exigidas pelos manifestantes.
Presidente, governadores e prefeitos são solidários, mas o Executivo continua sem compromissos efetivos com a reorientação dos investimentos para áreas prioritárias (educação, saúde, segurança pública e mobilidade urbana) e com o controle dos gastos públicos, além de seguir centralizador e autoritário.
Senadores, deputados federais, deputados estaduais e vereadores são solidários, mas os Legislativos continuam opacos no que diz respeito aos seus gastos e às condutas dos seus membros, não dão um sinal de austeridade nos seus gastos e seguem absolutamente submissos ao Executivo.
Agem com ouvido de mercador. Parecem, preocupados com a violência, mas descompromissados com qualquer reivindicação.
A solidariedade que o movimento espera não é de palavras, mas de mudanças efetivas na conduta ética e moral dos agentes públicos, de resgate dos valores republicanos e democráticos das nossas instituições, de maior eficiência dos serviços públicos oferecidos à população. Sobre isso, nenhuma medida efetiva.
Fosse verdadeiro o comprometimento com as causas levadas as ruas, a Presidente anunciaria a imediata reorientação dos gastos da Copa para as obras de infraestrutura urbana, prometidas e não executadas. O Senado, a Câmara dos Deputados, as Assembléias e Câmaras acabariam imediatamente com a aberração do voto secreto no Parlamento.
Talvez alguns pensem que a redução da tarifa de ônibus será capaz de desmobilizar as manifestações, sem que qualquer mudança estrutural do nosso sistema político e judicial ocorra. Quero crer que não.
Seria muito frustrante imaginar milhões de cidadãos nas ruas por vinte centavos. A luta é por muito mais que isso.
Ou, nós políticos, ouvimos e entendemos a voz que vem das ruas, ou seremos atropelados pela história.