Não interessa a ninguém um Poder Judiciário acuado e desmoralizado.

Estou muito a vontade para tratar da questão que diz respeito aos processos do prefeito Adail Pinheiro, de Coari.

Eu conheço bem o poder que ele tinha e ainda tem, obviamente, mas hoje infinitamente menor do que era nos anos de 2005 a 2008.

Relembro.

De 2005 a 2008 o município de Coari, através do poder e influencia de Adail Pinheiro e seus padrinhos locais e de Brasília, conseguiu com base em decisões judiciais subtrair, com a participação direta de magistrados, 200 milhões de Manaus (em valores atualizados hoje 500 milhões).  Sobre o assunto sugiro que leiam o artigo “O PODER DE ADAIL PINHEIRO” ( http://www.blogdosarafa.com.br/?p=19869 ).

Em 2008, estourou a OPERAÇÃO VORAX da Polícia Federal e ficou claro para todos nós como ele conseguia ganhar ações contra Manaus. Diante das revelações, tomei a iniciativa, pela primeira vez na nossa história, de representar perante o CNJ contra membros do Poder Judiciário pedindo a apuração dos fatos divulgados. Quando a imprensa divulgou o que eu iria fazer, recebi telefonemas de magistrados amigos em dois sentidos:

● – Um, de que uma representação perante o CNJ terminaria por me indispor com o Judiciário amazonense, e

● – Dois, dando-me todo apoio para que seguisse em frente, pois os fatos eram graves, essa não era uma prática da maioria esmagadora dos magistrados, mas de uma minoria que precisava ser excluída por não dignificar o Poder Judiciário.

Muito tranquilo segui em frente, protocolei a representação e depois fui recebido pelo Corregedor Ministro Cesar Asfor que me disse de forma bem objetiva que apuraria os fatos. E mais, que estava de saída para assumir a presidência do STJ, mas em seu lugar entraria o Ministro Gilson Dipp, tão rigoroso quanto ele.

Daí redundou em uma inspeção no TJAM em 2009 que comprovou os fatos e  aposentou magistrados. Isso me custou o mal olhado de alguns poucos que em nada alterou o meu sono.

Agora, a CPI da Pedofilia da Câmara Federal listou processos de responsabilidade de Adail Pinheiro que não andavam, inclusive os relativos à Operação VORAX, de 2008. O FANTÁSTICO se encarregou de dar repercussão nacional aos fatos e de repente a Justiça amazonense foi toda jogada no mesmo balaio.

Em seguida, dois processos contra Adail Pinheiro foram julgados pelo TJAM e considerados prescritos, e é bom dizer que estavam prescritos, mesmo. Isso provocou uma reação, principalmente nas redes sociais contra a Justiça como um todo.

A desembargadora Carla Reis, magistrada que merece o respeito de todos pela maneira séria, dedicada e justa como exerce as suas atividades, relatora de um dos processos prescritos, deu um desabafo em entrevista publicada em A CRÍTICA e republicada aqui no Blog  (http://www.blogdosarafa.com.br/?p=20230 ). Defende ela acertadamente que se deem nomes aos responsáveis pelo não andamento dos processos e amplia essa pesquisa para o Ministério Público deixando evidenciado que também ele dormiu e não fez o seu dever de casa.

Nesse clima, o Judiciário amazonense virou a “Geni” do Chico Buarque:

http://letras.mus.br/chico-buarque/77259/

Apanhando da imprensa local e nacional, do mundo político, aqui e em Brasília, do CNJ e nas redes sociais. Enfim, a própria Geni, mesmo.

Por último, a Presidente da CPI da Pedofilia, deputado federal do PT de Brasilia, Erika Kokay, resolver baixar o nível e chamou os magistrados de “frouxos”. Imediatamente isso ganhou as redes sociais, inclusive com banners colocando a deputada como heroína e o Desembargador Ari Moutinho, Presidente do TJAM, como vilão. E não apenas ele, mas todos os desembargadores.

Foi muito longe a deputada num gesto incompatível com sua função.

O Judiciário amazonense é uma instituição formada por homens e por óbvio tem suas falhas. Em todas as instituições, carreiras e profissões existem os bons e os ruins, os dedicados e menos dedicados, os sérios e não sérios. Não é diferente o Judiciário amazonense. E nem podia ser, por óbvio.

Agora, duas coisas pelo menos precisam ser realçadas:

● – Primeira, a imensa maioria do Judiciário amazonense é formada por pessoas do bem;

● – Segunda, os avanços do nosso Judiciário nos últimos dez anos, em todos os sentidos, como modernização, virtualização e rapidez, foram muito grandes e hoje estamos bem melhores do que outrora, inclusive, muito a frente da maioria dos tribunais brasileiros.

É um mar de rosas?

Claro, que não. Há muitos equívocos, que precisam ser corrigidos, mas isso não se fará com agressões gratuitas a magistrados e o descrédito do Poder Judiciário.

Entendo que a desembargadora Carla Reis tem toda razão. O Judiciário deve pegar um a um dos processos em que é parte o prefeito Adail Pinheiro e divulgar as datas, o tempo e em poder de quem estava cada um deles. E que cada um responda pela parte que lhe cabe. Como bem disse a desembargadora não dá para jogar todos no mesmo balaio. Isso é injusto, não resolve o problema e só complica a situação.

Aliás, é bom registrar que conforme noticia o Valmir Lima, do sempre atualizado Blog AMAZONAS ATUAL

http://amazonasatual.com.br/destaques/misterio-processo-de-adail-some-e-reaparece-na-justica-de-roraima/

os processos de Adail tem situações inusitadas. Um deles estava no TRF1 em Brasília, o desembargador federal declinou a competência para a Justiça estadual e o processo foi mandado para o Tribunal de Justiça de Roraima. Ou seja, quem fez isso faltou à aula de geografia e considerou que a capital do Amazonas era Boa Vista. Convenhamos…

Por outro lado, é bom registrar que a demora, a falta de critérios de como a fila anda é um dos mais sérios problemas da Justiça brasileira. E isso não é privilegio da Justiça amazonense.

Só para dar um exemplo bem recente: uma ADIN do Governo do Amazonas proposta em 1990, portanto 24 anos atrás, só foi julgada na semana passada. Quem engavetou esse processo por tanto tempo? O STF nos deve essa. E não apenas essa. Por exemplo, em 3 de fevereiro de 2010, portanto, há quatro anos, o STF aprovou a Súmula Vinculante nº 30 que diz:

“É inconstitucional lei estadual que, a título de incentivo fiscal, retém parcela do ICMS pertencente aos municípios”.

Concluída a votação, aprovada por 10 a 1, o Ministro Dias Tofoli pediu vista a pretexto de melhorar a redação. Pelo Regimento Interno do STF o seu prazo para devolução venceu na primeira sessão seguinte, mas até hoje não devolveu. Quatro anos engavetado.

O que teria havido? Não sei, sei que é muito estranho, mas isso não me dá o direito de, por exemplo, dizer que o Ministro é isso ou aquilo.

A quem interessa ter um Poder Judiciário acuado e desmoralizado, principalmente, por misturar os bons com os maus?

Só ao crime, pois isso não interessa à sociedade que quer Justiça e por consequência o equilíbrio social. E Justiça não se faz com um Judiciário desmoralizado.

Com a autoridade de quem foi o primeiro a ir ao CNJ contra atos irregulares de alguns magistrados, pagando o preço por tal atitude, manifesto daqui a minha solidariedade à instituição Justiça amazonense, na pessoa de seu Presidente e, portanto, representante maior, Desembargador Ari Moutinho pelas agressões injustas de que tem sido alvo.