Defensor da Constituinte: Morre Hermann Baeta, presidente da OAB durante a redemocratização

Do CONJUR:

Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil de 1985 a 1987, Hermann Assis Baeta morreu nesta sexta-feira (22/1), aos 84 anos. Entusiasta de causas agrárias e fundiárias, o advogado foi vanguardista nas principais discussões sobre a redemocratização do país, especialmente as travadas na Conferência da Advocacia de 1986, em Belém, que precederam a Constituição Federal de 1988.

“O Brasil perde um de seus melhores homens públicos. A OAB perde seu dedicado presidente e convicto defensor dos direitos humanos. A cidadania brasileira está de luto. O Brasil terá para sempre na memória a contribuição valorosa deste brasileiro à altura de nossa nação”, declarou o atual presidente da Ordem, Marcus Vinicius Furtado Coêlho.

 

Nascido em Coruripe, em 1º de dezembro de 1932, Baeta (foto) começou seus estudos na Faculdade de Direito de Alagoas em Maceió. Porém, logo se envolveu com política estudantil, elegendo-se para um cargo na União nacional dos Estudantes (UNE), tendo chegado ao posto máximo de secretário-geral da instituição.

Participou do Fórum Mundial da Juventude em Moscou. Após o término do Fórum, foi a Marrocos, onde participou da criação da União Geral dos Estudantes da África Negra, ainda sob domínio colonial português.

Por causa de sua entrada na UNE, mudou-se para o Rio de Janeiro e transferiu o curso para a Faculdade Nacional de Direito, onde se formou em 1962.

Presidente da OAB no momento em que o país era redemocratizado, Baeta defendeu que a assembleia que iria elaborar a nova Constituição deveria ser inteiramente nova e eleita para tratar apenas desse tema. A ideia acabou não sendo adotada de forma completa, já que senadores da assembleia anterior foram parte dos constituintes. No entanto, a atitude foi considerada vanguardista dentro da advocacia.

“Achávamos que a Constituição deveria ser uma obra máxima, da qual derivassem as leis, e que nenhuma lei poderia ser contrária a ela. E os juízes deveriam ser advogados que fizessem concurso público. Houve reações, mas venceram nossas teses. Os tribunais se ampliaram e democratizaram, o Supremo Tribunal Federal virou um órgão poderoso. Depois, propusemos até um controle para o tribunal, porque entendíamos que não deveria haver nenhum poder incontrolável”, afirmou Baeta em entrevista aos órgãos de comunicação da Ordem.

Em 1999 Baeta recebeu a Medalha Rui Barbosa do Reginaldo de Castro, então presidente do Conselho Federal da Ordem.

Inviolabilidade do advogado
Na conferência nacional de 1986 em Belém, liderada por ele, a OAB formalizou duas propostas que viriam a ser adotas na legislação: transformar a advocacia em função essencial ao funcionamento da Justiça — portanto, carreira do Poder Judiciário — e a inviolabilidade do advogado como requisito para um Estado Democrático de Direito.

Foi também em sua gestão que a Ordem transferiu sua sede do Rio de Janeiro para Brasília. Colegas contam que a mudança foi polêmica, pois até então o Rio era a capital do debate jurídico no Brasil.

O microfone de Sobral Pinto
Durante sua gestão como presidente do Conselho, Baeta passou por um episódio que é relembrado até hoje por quem o vivenciou. Em uma sessão plenária, o notório advogado Sobral Pinto monopolizou o microfone e falava por muito tempo. Os colegas queriam ter sua vez e estavam ficando irritados. Até que um chegou até Baeta e disse para ele cortar o microfone do renomado advogado. O então presidente retrucou: “Vamos fazer assim, eu vou até o banheiro. Nesse período você se senta aqui e corta o microfone. Daí ficará conhecido como o homem que tirou a fala de Sobral Pinto”.

Repercussão
“Baeta era um democrata militante. Sempre teve uma visão intensa de Brasil, do social e da política”, ressalta Técio Lins e Silva, presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros.

“Foi um grande presidente em um momento de transição do país. Ele iniciou o debate sobre a criação de um novo estatuto da advocacia, que viria a se concretizar anos depois. Foi um personagem importante por sua combatividade e tinha o entendimento que o advogado não é apenas alguém para recolher honorário e sim um agente social e político”, afirma Wadih Damous, ex-presidente do Conselho Federal OAB e atualmente deputado federal pelo PT do Rio de Janeiro.

“Foi um grande advogado e um digno homem público, sempre ao lado das boas causas que dão sustentação à democracia. O Brasil e a Ordem dos Advogados perdem um defensor convicto dos direitos humanos, da cidadania e do Estado Democrático de Direito”, diz Marcos da Costa, presidente da OAB-SP.

“Hermann Baeta foi um grande nome do direito brasileiro, esteve presente em momentos importantes para a nossa instituição, contribuindo por seu fortalecimento com trabalhos relevantes. A advocacia alagoana e brasileira está de luto”, lamentou a presidente da OAB Alagoas, Fernanda Marinela.

“Desaparece, fisicamente, um patriota, um imenso advogado, um cidadão exemplar, um líder insuperável, um grande amigo. Tristeza enorme”, afirmou o ex-presidente do Conselho Federal da OAB e da seccional paulista da entidade José Roberto Batochio.