DECISÃO DO SUPREMO INVIABILIZA POLO DE COMPONENTES NA ZONA FRANCA DE MANAUS

Por conta do que estabelece o Decreto lei nº 288/67 tudo o que for produzido na Zona Franca de Manaus por empresas que tenham projeto aprovado pela SUFRAMA é isento de IPI. Até aí todos estão de acordo. A divergência surge no momento seguinte quando um bem intermediário, componente, ou mesmo um insumo seja produzido aqui e vendido para fora da ZFM. Quanto à isenção continuamos todos de acordo, mas a questão é se quem compra esse bem intermediário tem direito, ou não, ao crédito do IPI que seria pago se não houvesse a isenção.

Para analisar a questão é necessário transcrever o que diz a Constituição da República, art. 153, parágrafo 3º, inciso II, a seguir transcrito:

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:

……………………………………….

IV – produtos industrializados;

§ 3º – O imposto previsto no inciso IV:

I – será seletivo, em função da essencialidade do produto;

II – será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores;

Aí surgem duas correntes.

A primeira, que interpreta literalmente, afirma que não há direito a crédito já que a Constituição trata de“montante cobrado” nas operações anteriores. Como nada foi cobrado, não há direito a crédito.

A segunda, a qual sempre defendi, entende que se não houver direito ao crédito não se caracteriza a isenção, mas sim mero diferimento já que aquilo que não foi pago na primeira operação será na segunda.

O Decreto lei nº 288/67 tem mais de 40 anos e, por incrível que pareça, essa é uma questão não resolvida.

Relembro um pouco a história para ao final entrar na situação atual.

Por razões óbvias, a Zona Franca de Manaus atrai empresas que fabricam produtos com alíquota mais alta de IPI. Não foi outra razão que os fabricantes de refrigerantes aqui instalaram suas fábricas que produzem concentrados. Elas aqui se instalaram entendendo que ao vender esses concentrados para o restante do país geravam crédito de IPI. Nos anos 90, a Receita Federal, que sempre entendeu que não há que se falar em geração de créditos de IPI, autuou um grande número de empresas Brasil afora.

Um desses processos de interesse da VONPAR REFRESCOS S/A chegou ao STF e teve como Relator o Ministro Ilmar Galvão que entendeu não ser cabível o crédito do IPI. O Ministro Nelson Jobim  divergiu e por dez votos a um prevaleceu o entendimento de que a empresa teria direito ao crédito.

Abaixo o resumo do julgamento:

RE 212484 / RS – RIO GRANDE DO SUL

RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a):  Min. ILMAR GALVÃO
Relator(a) p/ Acórdão:  Min. NELSON JOBIM
Julgamento:  05/03/1998           Órgão Julgador:  Tribunal Pleno

Publicação

DJ 27-11-1998 PP-00022  EMENT VOL-01933-04 PP-00725
RTJ   VOL-00167-02 PP-00698

Parte(s)

RECTE.     : UNIÃO FEDERAL
RECDO.    : VONPAR REFRESCOS S.A., SUCESSORA DE PORTO ALEGRE
                  REFRESCOS S.A.
ADVDOS.   : ANTÔNIO CARLOS GARCIA DE SOUZA E OUTROS

Ementa

EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IPI. ISENÇÃO INCIDENTE SOBRE INSUMOS. DIREITO DE CRÉDITO. PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE. OFENSA NÃO CARACTERIZADA. Não ocorre ofensa à CF (art. 153, § 3º, II) quando o contribuinte do IPI credita-se do valor do tributo incidente sobre insumos adquiridos sob o regime de isenção. Recurso não conhecido.

Decisão

O Tribunal, por maioria de votos, não conheceu do recurso extraordinário,
vencido o Sr. Ministro Ilmar Galvão, Relator. Votou o Presidente.Redigiráo acórdão o Sr. Ministro Nelson Jobim. Falou pela recorrida  o Dr.João D.Cordeiro Guerra. Ausentes,  justificadamente,  os  Srs.  Ministros Carlos Velloso   e   Celso  de  Mello  (Presidente) .  Presidiu  o  julgamento o Sr. Ministro Moreira Alves (RISTF, art. 37, I). Plenário, 05.03.98.

Em 1999 eu estava no Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda em Brasília e segui a orientação do STF julgando processo semelhante cuja Ementa a seguir transcrevo:

Número do Recurso: 105763
Câmara: PRIMEIRA CÂMARA
Número do Processo: 10935.001888/97-16
Tipo do Recurso: VOLUNTÁRIO
Matéria: IPI
Recorrente: SPAIPA S/A IND. BRASILEIRA DE BEBIDAS
Recorrida/Interessado: DRJ-FOZ DO IGUAÇU/PR
Data da Sessão: 06/07/1999 14:00:00
Relator: Serafim Fernandes Corrêa
Decisão: ACÓRDÃO 201-72942
Resultado: PPU – DADO PROVIMENTO PARCIAL POR UNANIMIDADE
Texto da Decisão: Por unanimidade de votos, deu-se provimento parcial ao recurso, nos termos do voto do relator.
Ementa: IPI – JURISPRUDÊNCIA – As decisões do Supremo Tribunal Federal fixem, de forma inequívoca e definitiva, interpretação do texto constitucional deverão ser uniformemente observadas pela Administração Pública Federal direta e indireta, nos termos do Decreto nº 2.346, de 10.10.97. CRÉDITO DE IPI DE PRODUTOS ISENTOS – Conforme decisão do Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 212.484-2 – RS, não ocorre ofensa à Constituição Federal ( art. 153, § 3, II) quando o contribuinte do IPI credita-se do valor do tributo incidente sobre insumos adquiridos sob o regime de isenção. CRÉDITO DE IPI DE PRODUTOS SUJEITOS A ALÍQUOTA ZERO – Não há que se falar em direito à crédito de IPI de produtos isentos adquiridos da Zona Franca de Manaus no período em que a alíquota dos mesmos for zero. CRÉDITOS EXTEMPORÂNEOS – Não serão admitidos os créditos, extemporâneos ou não, referentes a materiais de reposição para equipamentos da linha de produção quando não ficar provado que os mesmos foram consumidos no processo de industrialização e estavam sujeitos ao IPI. Recurso parcialmente provido.

Em tese o assunto estaria pacificado.

Ocorre que em 29 de abril de 2008 a Segunda Turma do STF por unanimidade aprovou o voto do Ministro Eros Grau  não admitindo o crédito, conforme se vê da Ementa abaixo:

RE 372005 AgR / PR – PARANÁ
AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a):  Min. EROS GRAU
Julgamento:  29/04/2008           Órgão Julgador:  Segunda Turma

Publicação

DJe-088  DIVULG 15-05-2008  PUBLIC 16-05-2008
EMENT VOL-02319-06  PP-01268
LEXSTF v. 30, n. 357, 2008, p. 192-197

Parte(s)

AGTE.(S): LINEA BRASIL INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE MÓVEIS LTDA E
   OUTRO(A/S)
ADV.(A/S): NESTOR FRESCHI FERREIRA E OUTRO(A/S)
AGDO.(A/S): UNIÃO
ADV.(A/S): PFN - EULER BARROS FERREIRA LOPES

Ementa

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IPI. INSUMOS ISENTOS, NÃO TRIBUTADOS OU SUJEITOS À ALÍQUOTA ZERO. PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE. CRÉDITO PRESUMIDO. INEXISTÊNCIA. MODULAÇÃO TEMPORAL DOS EFEITOS DA DECISÃO. INAPLICABILIDADE. 1. A expressão utilizada pelo constituinte originário — montante “cobrado” na operação anterior — afasta a possibilidade de admitir-se o crédito de IPI nas operações de que se trata, visto que nada teria sido “cobrado” na operação de entrada de insumos isentos, não tributados ou sujeitos à alíquota zero. Precedentes. 2. O Supremo entendeu não ser aplicável ao caso a limitação de efeitos da declaração de inconstitucionalidade. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.

Decisão

A Turma, por votação unânime, negou provimento ao recurso
de agravo, nos termos do voto do Relator. Ausente,
justificadamente, neste julgamento, a Senhora Ministra Ellen
Gracie. 2ª Turma, 29.04.2008.

Mais recentemente julgando um processo semelhante mais uma vez o STF decidiu contra o crédito de IPI.

Agora temos um novo processo pendente de julgamento. Nesse uma empresa de telefonia  ganhou no TRF 3ª, mas a Fazenda Nacional recorreu e foi dado ao julgamento o caráter de repercussão geral, ou seja, o que for decidido valerá para as instancias inferiores julgarem outros casos semelhantes.

Esse julgamento é uma questão de vida ou de morte para o Pólo de Componentes da Zona Franca de Manaus  e deve merecer o empenho de SUFRAMA, Governo do Estado, entidades de classe, enfim, de todos.

Faço o alerta com a responsabilidade que tenho sobre o futuro do Pólo e espero que as autoridades que podem e devem agir acordem, pois já estamos perdendo o jogo e uma decisão contrária será definitiva e sem volta. Isso significará o fechamento de todas as fábricas que produzem componentes, insumos e/ou parte e peças para outras indústrias Brasil afora. Ou seja, redução dos incentivos, desemprego, menos impostos e todas as conseqüências daí decorrentes.

Fica, portanto, o alerta. É agir agora, ou calar-se para sempre.