Cuba sem sinais vitais

Por Sandro Vaia

Nos anos 60, o filósofo Jean Paul Sartre escrevia “Furacão sobre Cuba”. Um grupo de valentes jovens barbudos descia a Sierra Maestra para expulsar um ditador, varrer um regime opressivo , trocar o domínio imperialista pela autodeterminação de um povo, e para iniciar a construção do “homem novo” em Cuba, pátria de José Marti, herói da independência do país caribenho.

A terra tremeu e o imaginário socialista no mundo, golpeado de morte pelas revelações do relatório Kruschev sobre os crimes de Stálin e pela revolta húngara esmagada por tanques russos, ganhou uma inesperada sobrevida.

É uma ironia que a revolução que mais encantou e seduziu os corações e as mentes dos jovens nas décadas de 60 e 70 venha agonizando publicamente em imagens tão patéticas como essas que marcaram o VI Congresso do Partido Comunista Cubano: Fidel, 85 anos, ladeado pelo sucessor, seu irmão Raul, à beira dos 80 e seu vice Ventura, também de 80, encenando o “Escravos de Jó” da sucessão.

Uma geração no poder há 52 anos era sucedida pela mesma geração.

A gerontocracia no poder, no caso, é apenas o símbolo da falência de um regime e – mais do que isso – de um projeto de engenharia social que pretendia reformar a natureza egoísta do ser humano e esculpir um “homem novo” que a sociedade justa, humana e solidária livraria dos velhos vícios.

A revolução cubana foi um fracasso tão grande que, além de não atingir nenhum dos seus objetivos, não conseguiu sequer preparar uma nova geração apta a dirigir os destinos do país e introduzir alguma espécie de reforma para dar vitalidade a uma economia burocratizada e esclerosada, incapaz de suprir as necessidades básicas da sua população.

Antes que a doença de Fidel Castro o obrigasse a abrir mão do poder e a entregá-lo ao irmão Raúl, alguns nomes chegaram a emergir e a fazer parte das especulações dos estudiosos do regime como possíveis “delfins”.

Dessa geração nova, destacaram-se especialmente três: Ricardo Alarcón, presidente da Assembléia Popular, Carlos Lage, vice-primeiro ministro, e Felipe Pérez Roque, ministro do Exterior.

Alarcón continua no cargo, mas com a importância aparentemente diminuída; Lage e Pérez Roque submergiram misteriosamente no anonimato, atingidos por genéricas denúncias de “excesso de ambição”.

Como acontece frequentemente em regimes totalitários e sem transparência, estrelas sobem, brilham e se apagam – ou caem em desgraça – com a mesma e inexplicável rapidez, sem que ninguém se sinta obrigado a prestar contas a uma opinião pública de resto inexistente.

A indicação de um membro da velha guarda, José Ramon Machado Ventura, também de 80 anos, como vice de Raúl Castro, é um sinal de que a confirmação da gerontocracia no poder não é uma homenagem à experiência ou um tributo a velhos heróis revolucionários, mas a prova de uma evidente e dramática falta de rumos de uma revolução cujos sinais vitais já se apagaram há muito tempo.

Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez. E.mail: svaia@uol.com.br