Compensação tributária com precatórios pode desafogar varas de execuções fiscais

Por Gabriel da Nóbrega Fernandes, Ana Clara Gemeinder de Mendonça e Caio Leonardo Corralo Tornincasa

Desde a Emenda Constitucional 94 de 2016, que incluiu o artigo 105 no ADCT da Constituição, já estava muito claro que os precatórios eram instrumentos hábeis ao pagamento de débitos tributários, contanto que “observados os requisitos definidos em lei própria do ente federado”, na mesma linha do que já estabelecia o artigo 170 do Código Tributário Nacional[1].

Até então, no estado de São Paulo, não havia disposição expressa acerca do tema, razão pela qual, inclusive, eram raras as manifestações do TJ-SP favoráveis à compensação via precatórios, eis que o entendimento vigorante era o de que “não é autoaplicável a norma prevista no novel art. 105, do ADCT, introduzido pela EC nº 94/2016, exigindo-se legislação específica estadual com previsão de requisitos para a compensação, até o momento não editada”[2].

Agora, em virtude da aprovação da Emenda Constitucional 99, em 14 de dezembro de 2017, a inclusão dos parágrafos 2º e 3º no artigo 105 do ADCT terminou por emprestar eficácia plena ao caput do dispositivo, pois ordenou que “os Estados, o Distrito Federal e os Municípios regulamentarão nas respectivas leis o disposto no caput deste artigo em até cento e vinte dias a partir de 1º de janeiro de 2018” (parágrafo 2º) e, em paralelo, estabeleceu que, em caso de omissão legislativa, “ficam os credores de precatórios autorizados a exercer a faculdade a que se refere o caput deste artigo”.

Em boa hora, antecipando-se ao Poder Legislativo, a Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo expediu a Resolução 12, de 2/5/2018, regulamentando o procedimento para a satisfação do débito tributário mediante precatórios.

A PGE-SP considerou que são aptos a pleitearem a extinção (i) o conjunto de credores, quando não houver a individualização do quinhão de cada credor no instrumento requisitório; (ii) o credor individual, quando já houver determinação da parte de cada um dos credores, além dos (iii) sucessores, que deverão estar habilitados nos processos originários dos precatórios, e, por fim, (iv) o advogado titular de precatório relativo à verba honorária.

Há ainda disposição importante do parágrafo único, artigo 3º apontando que somente o advogado patrono da causa originária do crédito com a Fazenda Pública poderia propor o acordo compensatório, justamente para proteger os advogados, com honorários a receber nos precatórios, da falta de reserva desses valores em seu favor, motivo pelo qual os contribuintes cessionários, por não terem seus causídicos nessas condições, não estariam condicionados à realização do pedido de compensação representados pelo mesmo advogado que requereu suas habilitações na origem.

Antes do pedido de extinção do débito tributário, o contribuinte deve habilitar seus créditos junto à PGE-SP, fase em que a Assessoria de Precatórios da instituição opinará sobre a regularidade formal e material dos créditos, atestando-se especialmente a titularidade e o cumprimento dos requisitos procedimentais (habilitação na origem, ausência de impugnação à titularidade e ao valor do crédito etc.) — parecer que será chancelado ou não pelo procurador-geral-adjunto, mediante decisão fundamentada e publicada no Diário Oficial do estado.

O requerimento da compensação em si acontece somente após a autorização pelo PGE-adjunto, ocasião em que impugnações ao valor do débito ou do crédito prejudicará a pronta compensação, discussão que será remetida ao juízo das execuções fiscais para apreciação.

Caso não haja impugnação, a PGE homologa a compensação, comunicando o TJ-SP para respectiva baixa da obrigação e extinção da execução do precatório na origem.

Neste contexto, de maneira geral, é razoável, adequada e proporcional a nova política pública implementada pela PGE-SP. Passado um mês da entrada em vigor, apenas um requerimento havia sido processado no âmbito da PGE-SP, mas a Resolução 12/2018 representa, de fato, instrumento eficaz de redução do estoque de precatórios no âmbito estadual, desafogamento das varas de execuções fiscais estaduais e, por consequência, de extinção do passivo tributário dos contribuintes — além de ampliar o horizonte do mercado de compra e venda de precatórios.


[1] Art. 170. A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda pública.
[2] TJSP – Agravo de Instrumento 2088690-44.2018.8.26.0000; Relator (a): Paulo Barcellos Gatti; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Público; Foro das Execuções Fiscais Estaduais – Vara das Execuções Fiscais Estaduais; Data do Julgamento: 11/06/2018; Data de Registro: 15/06/2018.