Renca, sucessão de desacertos

Osíris Silva

A Reserva Nacional de Cobre e Associados – Renca, localizada entre Pará e Amapá, criada em 1984, no final do governo militar, acaba de ser vítima de novos equívocos substantivos do governo federal na Amazônia. O que apenas confirma a omissão criminosa de Brasília sobre o Setentrião brasileiro, a região mais estratégica e rica do universo geopolítico do país. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente – MMA, a Renca determina o monopólio do governo sobre qualquer atividade mineral em sua área, de 46.501 quilômetros quadrados, do tamanho do Espírito Santo e de meio Portugal.

Objeto de intensa cobiça empresarial sobrepõe-se, em sua maior parte, a oito unidades de conservação e duas terras indígenas. Abarca parte do Parque Nacional Montanhas de Tumucumaque, no Amapá, a maior área de proteção federal do país, e da Floresta Estadual do Paru, no Pará, a maior área protegida do Brasil. O decreto de extinção foi publicado e suspenso agora em agosto por determinação do juiz Rolando Valcir Spanholo. Fundamentou sua decisão em dispositivo constitucional que determina que uma reserva só pode ser extinta por lei do Congresso.

O governo brasileiro é pródigo em criar reservas.  É, porém, incompetente em preservá-las e explorá-las economicamente. Foram instituídos em maio passado mais 2,83 milhões de hectares abrangendo o Parque Nacional do Acari, as Florestas Nacionais do Aripuanã e de Urupadi, a Área de Proteção Ambiental e a Reserva Biológica Manicoré, e ampliada a Floresta Nacional Amaná. Todas situadas ao sul do Amazonas, na bacia do Rio Madeira. A hipótese seria   viabilizar a economia local baseada no manejo florestal sustentável, na agropecuária, na mineração e no ecoturismo, face às suas estonteantes belezas naturais.

O Brasil, via MMA, tem como base da ação federal na região a Agenda 21, programa de planejamento para a construção de sociedades sustentáveis em diferentes bases geográficas, procurando conciliar proteção ambiental, justiça social e eficiência econômica. Dentre os programas, destaco: Águas Subterrâneas, Bolsa Verde, Cadastro Ambiental Rural – CAR, Corredores Ecológicos, Educação Ambiental, Revitalização das Bacias e Zoneamento Ecológico Econômico – ZEE.

O ZEE é um poderoso instrumento de gestão territorial e ambiental com pretensão de integrar aspectos naturais e sociais na gestão do território. Busca planejar e ordenar as ações públicas, harmonizando as relações econômicas, sociais e ambientais que aí se processam. Por sua grandiosidade, demanda efetivo esforço de integração das ações e políticas públicas consentâneas. Que não avançam.

A grande maioria desses programas, sobretudo o ZEE, a Reserva Mamirauá, no Amazonas, a Cabeça do Cachorro, em Roraima, Unidades de Conservação, Corredores Ecológicos, Parques Nacionais, por falta extrema de recursos financeiros e humanos encontram-se em estado de exaustão. Desta forma, tem sido praticamente impossível romper o vazio inexorável que se abate sobre a Amazônia e que expõe a região a ações predadoras oportunistas.  O clamor público é legítimo, mas inócuo, além de festivo, no caso de celebridades e ambientalistas. Não se  percebe que tais programas são apenas retóricos. O engodo de fato a ser combatido.

Com efeito, do total da área territorial do Amazonas (1,6 milhão de km2), 54 % (841,9 Km2, ou 841,9 milhões de hectares) são comprometidos com reservas florestais distribuídas entre União, Estado e povos indígenas. Numa conta simples, sobram livres para exploração sustentável aproximadamente 143,45 milhões de hectares, descontados 80% de reserva legal. O ZEE determinaria as vocações das diversas calhas da bacia, o governo estadual estabeleceria campos prioritários de intervenção em consonância com a pesquisa, enquanto Ufam e Uea formariam a mão de obra especializada requerida pelas operações. Muito provavelmente, um plano perfeito. Porque não funciona? Eis a magna questão.

Cientistas e pesquisadores comprometidos com os interesses nacionais defendem hoje o desenvolvimento como única via de preservação da Amazônia. No que concordo. Só o desenvolvimento sustentado, em que se concilie exploração racional dos recursos da biodiversidade com crescimento econômico será capaz de manter a integridade de nosso ecossistema.

Desenvolver e preservar é, sem dúvida, possível e viável. Nessa direção devem dobrar os sinos.

Manaus, 4 de setembro de 2017.