Pela categoria, Dodge recorre de decisão que deu fim ao benefício

De O GLOBO:

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, recorreu da decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux, que, na segunda-feira, revogou o pagamento do auxílio moradia a juízes, promotores, procuradores e integrantes de outras carreiras jurídicas. O objetivo é impedir a suspensão do benefício para os integrantes do Ministério Público (MP). Fux proibiu o pagamento do penduricalho em todo o país após acordo para que fosse sancionado o reajuste salarial de 16,38% para ministros da Corte a partir de 2019. Segundo a Procuradoria Geral da República (PGR), foram gastos R$ 4,65 milhões em outubro deste ano com o benefício apenas no Ministério Público Federal (MPF). Multiplicado por 12, o valor estimado chega a R$ 55,79 milhões por ano, sem incluir o Ministério Público estadual e outros ramos do Ministério Público da União.

A própria Dodge não recebe auxílio moradia. Ela tinha direito, mas, em agosto de 2017, pouco antes de assumir o cargo, pediu a suspensão. Mesmo assim, em fevereiro deste ano, em outro parecer enviado ao STF, Dodge já tinha defendido a legalidade do benefício. Agora, em novo parecer, ela foca apenas em questões técnicas. A procuradora-geral sustenta que a decisão de Fux, tomada num processo que diz respeito apenas a juízes, não poderia alcançar outras carreiras jurídicas. Diz ainda que o pagamento do benefício a integrantes do MP é baseado na Lei Orgânica do Ministério Público.

“AFRONTA À AMPLA DEFESA”

Na decisão, Fux diz que ela se aplica ao Poder Judiciário, ao Ministério Público, às Defensorias Públicas, aos Tribunais de Contas e a “qualquer outra carreira jurídica”. No seu entendimento, deve haver “simetria” entre as diferentes carreiras. Dodge discordou. Para ela, ao não ouvir o Ministério Público no processo em que foi tomada a decisão, houve “ostensiva afronta à ampla defesa e ao contraditório” e também ao devido processo legal. Dodge lembra que o benefício de procuradores e promotores está sendo tratado em outra ação ainda pendente de julgamento pela Corte. Ela pede que Fux reconsidere a decisão ou remeta o assunto ao plenário do STF: “São juízes demandando contra a União, sem que houvesse citação do Ministério Público. No fim, o Ministério Público e o Conselho Nacional do Ministério Público são instados a obrigações sem terem sido citados e sem qualquer possibilidade de defesa. O mesmo, diga-se, aplica-se à Defensoria Pública, ao Conselho Nacional de Justiça e a inúmeras instituições públicas”, argumentou.

Em 2014, Fux deu várias liminares garantindo o pagamento do auxílio moradia aos magistrados brasileiros. Este mês, com a sanção do reajuste dos salários de ministros do STF, aos quais os demais juízes estão vinculados, Fux cumpriu sua parte no acordo feito com o presidente Michel Temer e revogou o pagamento do auxílio. Com o reajuste sancionado, o salário de ministros do STF passará de R$ 33,7 mil para R$ 39 mil. Na última decisão, Fux mencionou a situação econômica do país, mas continuou dizendo que o benefício é justo. Isso foi ressaltado agora por Raquel Dodge: “Ora, passados quatro anos desde a concessão da medida, a decisão que agora revogou a antecipação de tutela não apontou qualquer fator que infirmasse os argumentos anteriormente invocados para a concessão da liminar, evidencias se a ilegalidade ou inviabilizasse a percepção do benefício em causa”.

No parecer de fevereiro, Dodge defendeu o pagamento no MP: “A leitura da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público mostra que o legislador incluiu entre os direitos dos membros do parquet (Ministério Público) a desoneração, mesmo que parcial, em matéria de moradia. Ao dizer que, onde não houver residência oficial, é devido o auxílio, deixou claro que a verba compensa os que não receberam residência oficial condigna, assumida como obrigação do Estado”. O auxílio moradia na prática eleva rendimentos de procuradores, promotores e juízes, fazendo com que muitos deles ganhem mais do que o teto constitucional do funcionalismo. Em fevereiro, Dodge argumentou que não se trata de salário disfarçado, uma vez que nem todos recebem o benefício. Embora a grande maioria tenha direito, ele não é pago a quem tem residência oficial à disposição ou é casado com alguém que já receba auxílio moradia.