Por José Dirceu, no Blog do Noblat:
O presidente Lula, prestes a entregar a faixa presidencial a sua sucessora, Dilma Rousseff, volta a deixar claro que não deixará de fazer política a partir de 2011. Na primeira entrevista concedida por um presidente a blogueiros, Lula afirmou que ele próprio será, ano que vem, um blogueiro e um tuiteiro.
Como era de se esperar, a importância desse ineditismo ficou em segundo plano na cobertura da grande mídia, que preferiu desmerecer o papel dos blogueiros a destacar os temas debatidos. Assim, a grande mídia perdeu mais uma oportunidade de entrar na discussão sobre regulação de mídia —como disse o presidente, “regulação não é crime, censura é que é crime”.
A grande mídia poderia, por exemplo, analisar o impacto que as novas mídias terão na produção jornalística tradicional ou a questão da convergência de mídias.
A razão maior desse comportamento anti-Lula é um certo inconformismo com o fato de o presidente ser extremamente popular e seu governo muito bem avaliado, apesar dos ataques cotidianos que a grande mídia faz. É possível que a perseguição continue, porque ele já declarou que irá seguir atuante quando deixar a Presidência.
Não há dúvidas de que o diálogo direto de Lula com a sociedade, na condição de ex-presidente com maior aprovação e popularidade na história do país, será importantíssimo para enriquecer o debate que precederá as mudanças que a presidenta Dilma pretende fazer —a erradicação da miséria, a preparação do país para a Copa e Olimpíadas, as reformas política e tributária, por exemplo.
A capacidade de comunicação direta que Lula tem com o povo brasileiro, especialmente depois de livre dos limites impostos pela condição de presidente da República, também será essencial na disputa diária contra os interesses poderosos que se opõem aos governos progressistas com apoio da imprensa corporativa.
Com a característica que marcou sua trajetória política desde a época de torneiro mecânico, Lula tem condições de deixar ao Brasil, além de um país menos desigual e em franco crescimento e modernização, um novo papel para os ex-presidentes —nos países desenvolvidos isso já acontece, como é o caso, por exemplo, de Jimmy Carter nos EUA.
Lula vem de uma geração que recriou o sindicalismo por meio do diálogo e da negociação e foi capaz de unir sob um mesmo partido —o Partido dos Trabalhadores— um leque muito diverso de aspirações políticas que estavam dispersas no Brasil após a redemocratização. Como presidente, conduziu um governo exemplar, inédito em muitos sentidos e realizações.
Essa experiência faz de Lula uma grande liderança para o PT, um exemplo para os movimentos sociais, uma inspiração para o próximo governo e um agente de grande influência para o povo brasileiro e no cenário internacional. Só temos a ganhar a partir do momento em que o debate com a sociedade passe a ter um ator e mediador com esse peso político.
A Internet é um meio que facilita muito esse contato amplo com a sociedade. O presidente reconhece que se tornou a liderança que é também graças à imprensa, com todas as suas qualidades e defeitos. Mas ressalta, com inteligência, que essa já é uma mídia “velha”.
Afinal, é na Internet, onde o espaço para o contraditório é livre e infinito, que as opiniões são formadas por meio do debate ativo, sem imposições empresariais de temas, tempos, espaços e enfoques. E cada vez mais assim será.
Se for fiel ao pensamento do presidente e de sua sucessora, o projeto de regulamentação da mídia que Lula promete deixar para Dilma certamente contemplará a necessidade de incentivar o pluralismo e a democratização da mídia, criando condições para que veículos de comunicação participativos e inclusivos se disseminem pelo Brasil, o que é promissor.
Somente dessa maneira o debate político voltará a ser um meio de enfrentamento de idéias e de capacidade de geração de maiorias e consensos, e não somente a riqueza de conglomerados de comunicação e sua transmissão onipresente. Nesse ringue, não há dúvidas, Lula seguirá como um dos maiores defensores dos interesses do Brasil.
José Dirceu, 64, é advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT