Desequilíbrio no gabinete: Procurador da Fazenda não pode assessorar em tribunal

Do CONJUR, Por Alessandro Cristo:

Por ordem do Conselho Nacional de Justiça, a procuradora da Fazenda Nacional Patricia de Seixas Lessa terá de deixar o gabinete do juiz federal convocado Theophilo Antonio Miguel Filho, no Tribunal Regional Federal da 2ª Região, onde trabalha como assessora. Liminar concedida nesta terça-feira (25/6) pelo CNJ considerou que a participação de procuradores na assessoria de juízes convocados pode desequilibrar julgamentos envolvendo Fisco e contribuintes. Theophilo Miguel é relator de um caso de R$ 35 bilhões que opõe Receita Federal e a mineradora Vale. Patricia chegou a atuar no caso ainda como procuradora.

Na justificativa de sua liminar, o conselheiro José Lúcio Munhoz, relator do Procedimento de Controle Administrativo no CNJ, afirmou que a Lei 11.890/2008 não autoriza a cessão de procuradores a não ser para tribunais superiores e para o Supremo Tribunal Federal, o que motivaria a suspensão da procuradora pelo menos até o Conselho julgar o mérito do caso.

No dia seguinte à decisão de Lúcio Munhoz, o conselheiro Wellington Cabral pediu vista do processo. Ao adiar a decisão, o CNJ mantém a liminar até o conselho julgar o mérito do Procedimento de Controle Administrativo que trata do caso. Antes do pedido de vista, o ministro Joaquim Barbosa e os conselheiros Neves Amorim e Guilherme Calmon chegaram a questionar as justificativas apresentadas por Munhoz ao vedar a atuação de procuradores como assessores nas cortes. “O tribunal vai ignorar sua liminar. É uma coisa mais do que comum a atuação [dos procuradores] nos tribunais”, disse Barbosa.

A concessão da liminar teve também como embasamento a demora do CNJ em votar a questão em Plenário. Em despacho monocrático, o conselheiro criticou a lentidão do órgão em colocar fim à questão. “O presente feito se encontra pautado e em condições de ter o seu mérito apreciado pelo Plenário por mais de um ano, o que depõe contra a necessária celeridade, matéria que deve ser uma das primeiras a ser enfrentada pelo órgão, quanto ao Poder Judiciário como um todo”, disse. “Em face de uma ilegalidade aparente, não é razoável submeter a parte a ficar no aguardo do julgamento de mérito pelo Conselho Nacional de Justiça por semanas seguidas, enfrentando gastos com deslocamentos até esta capital federal.”

A decisão é fruto de pedido feito pela OAB do Rio de Janeiro em Procedimento de Controle Administrativo. O então procurador-geral da entidade e atual vice-presidente, Ronaldo Cramer, requereu a anulação de todos os atos normativos do TRF-2 que autorizem a cessão de procuradores da Fazenda Nacional para exercer cargo de assessoria em Turmas Especializadas em casos tributários na corte. O argumento é que a participação de procuradores viola o princípio da paridade de armas. “Um procurador da Fazenda cedido ao Tribunal Regional Federal não garantiria a paridade processual ao minutar um voto em uma demanda entre o cidadão contribuinte e a União”, diz a petição da OAB-RJ. Ao trabalhar como assessores, procuradores cedidos não se desvinculam institucionalmente das Procuradorias, apenas se licenciam.

Tanto o tribunal quanto Patrícia contestaram as afirmações. Disseram que a cessão é constitucional e legal, com base no artigo 37, incisos II e V, da Constituição; na Lei 8.112/1990 (artigo 93); na Lei Complementar 73/1993 (artigo 26); e no Decreto 4.050/2001 (artigos 1º e 2º). Para a OAB, no entanto, não se trata da mera cessão de servidor público. O problema é o risco à isonomia processual.

A OAB pediu urgência na liminar. A essa altura, o recurso da Vale no TRF havia sido incluído em 15 pautas, sem que até a presente data tenha sido chamado para julgamento nas sessões, sendo, nas últimas oito vezes, simplesmente adiado em razão do término da sessão.

Para o presidente da OAB-RJ, Felipe Santa Cruz, a decisão não se limita ao caso da procuradora. “Foi uma grande vitória, embora ainda não se trate de decisão definitiva, visto o caráter de liminar. O pedido, tecnicamente embasado, que enviamos ao CNJ adverte que as partes envolvidas em determinado processo da Fazenda Federal não podem, por lei, também integrar a instância que julga. Portanto, os procuradores não podem ser assessores do TRF por incorrer em risco de ser parte do mérito. É bom deixar claro que nosso pedido não se limita a uma região, ou profissional, mas a todas que se encontrem na mesma situação nos tribunais do país. Vamos continuar buscando esse objetivo até o julgamento definitivo do mérito”, diz o advogado.

Comentário meu: Óbvio que ter uma Procuradora da Fazenda para redigir a decisão do Juiz acaba com a paridade das armas. Correta, a meu ver, a decisão, ainda que liminar, do CNJ. Isso é tão grave quanto um assessor do Juiz ser ligado a um escritório de advogados.