Campos, a semeadura da mudança

Por Alfredo MR Lopes (*) alfredo.lopes@uol.com.br:

A comunidade científica lamentou com razões adicionais a morte do ex-ministro Eduardo Campos, da Ciência, Tecnologia e Inovação, um marco institucional para o avanço da ciência, tecnologia e inovação no Brasil, pilares fundamentais para um processo de desenvolvimento que combine crescimento econômico, justiça social, redução das desigualdades regionais e melhor posicionamento do país na ordem global. Ele acrescentou o I de inovação, e lhe assegurou o marco legal, em sua passagem pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, de 2004 a 2006. Ele olhou para a Amazônia com a lente do compromisso e postura visionária. Daí sua defesa da importância vital dos recursos para Pesquisa & Desenvolvimento na região. Segurança alimentar, questão climática e energética, biossegurança na ótica imperativa da sustentabilidade, marcaram sua passagem pela gestão federal de C&Te I. Para ele, o Brasil precisava urgentemente formular nova abordagem, inteligente e racional, de dois terços de seu território, a Amazônia, a responder e integrar de forma robusta a liderança deste enfrentamento continental e global.

Em sua última passagem por Manaus, no início deste ano,  destacou a estruturação básica do imperativo da produção alimentar, notadamente na produção de proteína animal. Aquicultura tem como premissa a biotecnologia da inovação, e está relacionada diretamente a uma  na revolução da logística dos transportes como fizeram os ingleses para abastecer o mundo com a borracha e demais produtos da floresta, há mais de cem anos. No entendimento proativo com sua companheira de chapa, a ambientalista Marina Silva, Campos ergueu a bandeira da diversificação dos negócios dessa fascinante empreitada, com a integração inteligente dos agronegócios, lembrou que ninguém vai construir BR-319. Ela já existe. O debate será sobre a melhor integração logística. Desafios   ordenados por seus respectivos marcos regulatórios, aqueles que já estão consignados e a consignar  à luz da diversidade étnica, da pluralidade de interesses e dos direitos civis. “Foram dez meses de convivência diária e de aprendizagem”, descreveu assim a ambientalista Marina Silva, diante da perda irreparável do companheiro de chapa presidencial.

A pluralidade dos interesses, a partilha de vantagens e o resguardo do estoque natural são itens de um legado para as mudanças de paradigmas que o país exige, e que as novas matrizes econômicas impõem ao modelo incentivado da ZFM, ora prorrogado por mais 50 anos. Como utilizar as ferramentas do conhecimento, as oportunidades dos 60 anos de inventario do bioma amazônico, suas várzeas, campos gerais, rios e lagos, com sua potencialidade e generosidade de recursos para assegurar a sobrevivência desta civilização? Empreender na Amazônia significa  adotar tecnologias de manejo, assegurar o expediente do zoneamento participativo em que as comunidades tradicionais  ajudem a definir potencialidade e fragilidade socioambiental. Carecemos política que aglutine sem ressentimento nem retaliação, capaz de priorizar pesquisa e inovação, gestão transparente dos recursos à luz do bem comum. Há que se refletir no legado de Eduardo Campos, sua diferenciação entre programa de Estado e proposta de governo no sentido tacanho da sedução eleitoral e nos limites estreitos e eleitoreiros de um mandato eletivo. É hora de parar para trocar a liturgia da encenação pela semeadura da transformação.

(*) Alfredo é filósofo e ensaísta

Alfredo MR Lopes
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