A travessia

Por Marcelo Ramos:

Aquele não era um bom dia. Era uma dia daqueles que a angústia e o sentimento de impotência acometem a alma. Aquele era um dia em que eu duvidava da travessia e julgava que a humanidade prefere ficar na margem da violência, da injustiça, da intolerância e da opressão, enxergando do outro lado a margem do amor, da caridade e da justiça, mas sem disposição pra atravessar as águas do conformismo e da omissão.

Entrei em uma livraria. Abri um livro de Thiago de Melo exatamente na página do poema “A janela encantada” e li: “A vida sempre foi boa comigo. Quando soube que o meu coração estava carregado de sombras, e que ele só se alimentava de luz, abriu uma janela no meu peito para que por ela possam entrar o resplendor do orvalho, o fulgor das estrelas e o invisível arco-íris do amor”.

É incrível a força da poesia, dessa em especial, isso justifica que a repita após usá-la em um artigo anterior.

Lido aquele poema que encontrara por acaso ao folhear um livro, estava pronto para seguir minha luta pela travessia. Pronto pra seguir minha missão.

Há dias de desesperança – isso é certo na vida de todos – não há quem viva só de alegrias e certezas. Mas se o seu coração é daqueles que se alimentam de luz, haverá de abrir-se a janela encantada para que entre o invisível arco-íris do amor.

Não podemos desistir – nem por omissão e nem por covardia – de enfrentar as águas e procurar a outra margem do rio.

Nas palavras de Fernando Pessoa, desistir é ficar à margem de nós mesmos.

“Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos”.

Abandonemos tudo que nos imobiliza, tudo que nos prende a essa margem do rio, há do outro lado um mundo melhor que nos espera. Façamos cada um a sua travessia pessoal, renovemos valores e condutas e quando menos esperarmos estaremos juntos experimentando a alegria da paz e da justiça.