Vou Lembrar de Você, Professor.

Por Luis Cláudio Chaves:

Comecei a frequentar os estádios Vivaldo Lima, o nosso Vivaldão, e o Ismael Benígno, a Colina, desde os primeiros anos da minha infância. A paixão pelo Nacional me foi passada pelo meu pai. Não faltávamos um jogo sequer. E chegávamos cedo, dava até pra assistir boa parte da preliminar.

Certa vez, não lembro quando, mas ainda durante minha infância, recordo ter perguntado ao meu pai quem eram aqueles homens que estavam em todos os jogos e chegavam antes da gente. Ele então me explicou: “aquele ali sentado mais ao lado direito das cabines de rádio é o seu Caetano, pai do Arnaldo Santos, Narrador. Olha o Arnaldo ali, na cabine logo acima”. Então, eu retruquei: como pode ele ser o pai do Arnaldo Santos se ele é nacionalino e o Arnaldo, rionegrino?. Meu pai riu e disse: “mas o filho não é obrigado a ter o mesmo time do pai”. E seguiu explicando “Aqueles outros dois, sentados do lado esquerdo, são o Flaviano Limongi, primeiro Presidente da FAF, e o outro é o Carlos Zamith, da coluna Baú Velho”.

Pois bem, o tempo passou, tornei-me leitor assíduo do Baú Velho, no jornal A Crítica, todos os domingos. Lia também a Coluna Bazar do Flaviano Limongi, mas confesso: gostava mesmo era do Baú. Ficava indignado quando pegava o jornal e percebia que a foto e o assunto principal da coluna não eram o Nacional. Pensava: pra quê falar desses outros times. Agora, iria ter de esperar até o próximo domingo!

Lendo o Baú conheci uma estranha sensação: ter saudade de algo que não vivi. Algumas vezes, cheguei a pegar minha bicicleta – uma Barraforte azul, da cor do Naça, é claro – e pedalar do Boulevard, onde nasci e cresci, até o portão do velho Parque Amazonense, primeiro estádio de Manaus, só pra ficar olhando lá de cima e imaginando aqueles jogos incríveis, por exemplo: a final do primeiro Campeonato Amazonense Profissional de 1964, conquistado pelo Nacional em cima do São Raimundo.

Gostava também de ler sobre os títulos do Nacional conquistados durante a minha infância na década de 70, os estádios lotados, enfim, detalhes e histórias não observados por mim na época. Destes, destaco o tetracampeonato de 1979, 40.193 pagantes, gol de Raul, na prorrogação. Fui mascote nesse jogo e entrei em campo junto com o Corrêa, meio – campista.

Vieram os livros do Baú Velho. A partir deles, eu e muita gente tomamos conhecimento da dimensão deste trabalho. Informações sobre o primeiro Rio-Nal, a origem dessa expressão, seu criador, os artilheiros, os campeões desde o primeiro campeonato amazonense, as escalações, os gols mais rápidos, as histórias, a Fada, a criação da FAF, o Vivaldão, a Colina, o Parque, etc.

E mais, através dessa obra pude descobrir o espírito inquieto e revolucionário de um homem que quando chegou pra trabalhar na Rádio Rio-Mar, em 1954, não havia cobertura sobre o futebol local. Passavam resenha do Rio de Janeiro. Lutou até conseguir colocar o futebol local no ar. Não se acomodou, fazendo o que era mais fácil. Sua ideia foi seguida pelas Rádios concorrentes da época, Difusora e Baré.

Depois disso, o futebol ganhou impulso, veio a profissionalização e os anos de ouro, os estádios lotados, a criação da FAF. Precisamos urgentemente de novos Carlos Zamiths nas redações do jornais, rádios e televisões locais. O mínimo que os donos de veículos de comunicação deveriam determinar aos noveis jornalistas esportivos era que desligassem um pouco os aparelhos de televisão das redações e cuidassem de ler o Baú Velho.

Difícil aparecer alguém com esse espírito nas redações esportivas. Estão muito ocupados pensando em como irão compilar as matérias da imprensa sulista. Mas, é nos momentos de crise que costumam emergir os talentos.

Aos 87 anos o Jornalista Carlos Zamith partiu. Ficarão sua obra e o seu exemplo. Vou lembrar de você, Professor.