Santa Casa de Misericórdia: um proposta de solução.

A saúde no Brasil na primeira metade do século passado era, preponderantemente, filantrópica e particular. A saúde pública praticamente não existia.

Em Manaus no final XIX, no auge do ciclo da borracha, os empresários portugueses construíram e mantinham dois hospitais: a Beneficente Portuguesa (1873) e a Santa Casa de Misericórdia (1880). O primeiro, como o próprio nome está dizendo, destinava-se a atender a colônia portuguesa e o segundo, os nativos.

A carga tributária era baixa e as empresas faziam doações para os dois hospitais e garantiam o funcionamento.

Essa realidade se manteve até os anos 60 do século passado quando foram construídos o Hospital Getúlio Vargas e a Maternidade Balbina Mestrinho. A partir daí progressivamente a saúde pública foi ampliando e a filantrópica, no caso, feita pela Beneficente e Santa Casa, foi declinando por razões óbvias: a quebra da borracha e por consequência das empresas portuguesas e a falta de doações.

Hoje quero falar apenas da Santa Casa que nos anos 60/70 era administrada por pessoas dedicadas, competentes e conhecedoras da realidade. Destaco dois: os saudosos profissionais da saúde, o professor, farmacêutico e bioquímico Manoel Bastos Lira e a enfermeira e administradora Josephina Melo.

Com a falência do modelo de financiamento, pois as doações acabaram, a Santa Casa passou a viver de serviços prestados ao INAMPS e ao Governo do Estado e, a partir da nova Constituição, ao SUS.

Em 2003/2004 a Santa Casa bateu no fundo do poço, seja pela baixa remuneração do SUS, seja porque a gestão não era boa, além dos seus dirigentes serem desconhecidos, sem a articulação dos seus administradores de outrora. Foram tantos os problemas entre o hospital e o SUS que este suspendeu a prestação de serviços.

Tive oportunidade de participar direta ou indiretamente de reuniões que objetivavam “salvar” a Santa Casa. Lembro-me de uma ocorrida na Reitoria da UEA em que a então diretoria colocou a situação e reivindicou ao Governo do Estado que lhe repassasse recursos para a compra de um equipamento de ressonância magnética que custava muitos milhões de reais com o qual prestaria serviços, inclusive ao SUS, e conseguiria recursos para superar a crise. O Governo do Estado manifestou-se dizendo que não faria isso e sugeriu que a Santa Casa se especializasse em serviços para os quais o SUS tinha grande demanda, como por exemplo, os relativos à maternidade. A diretoria não topou.

De outra feita, eu já era prefeito, e o Governo do Estado fez uma proposta que a meu ver era e é a melhor: a Santa Casa dizia ter dívidas em um determinado montante. O Governo do Estado propunha alugar o hospital por dez anos. O valor do aluguel seria o valor da dívida. Por exemplo, a dívida era de 18 milhões de reais. Em 120 meses isso daria 150 mil ao mês. No âmbito do Estado seria criada uma comissão encarregada de auditar as dívidas e ir negociando e pagando, inclusive, antecipando meses que ainda iam vencer até o limite de 18 milhões. O Governo restauraria o hospital e faria uma maternidade e/ou um grande ambulatório. Quem não topou foi a diretoria da Santa Casa. Os diretores queriam que o Governo do Estado repassasse o valor da dívida e eles reabririam o hospital. Óbvio, e acertadamente, que o Governo do Estado não concordou.

Hoje o prédio da Santa Casa está abandonado e até sendo ocupado por pessoas que produzem salgadinhos que são vendidos nas ruas do centro.

Defendo que o Poder Público, Governo do Estado ou Prefeitura, até para salvar o patrimônio histórico que é o prédio da Santa Casa, desaproprie o imóvel, deposite em juízo o valor que entender correto e que ficaria a disposição dos credores, restaure o prédio e ali faça funcionar uma unidade de saúde que pode ser uma maternidade e/ou um grande ambulatório.

Esse, a meu ver, é o melhor caminho. Se alguém tiver outro melhor, por favor, proponha.