E nós, quando vamos pedir desculpas a Jango pelo nosso esquecimento?

Amanhã, quarta feira, os restos mortais de João Goulart sairão de São Borja para Brasília onde serão exumados a fim de que sejam aprofundadas as investigações para saber-se se ele morreu de um ataque cardíaco ou se foi envenenado. No dia seguinte, quinta feira, haverá uma homenagem póstuma por parte do Governo brasileiro, com a presença de todos os ex-presidentes, à ele que foi deposto em 1964. Tal homenagem tem um objetivo simbólico e emblemático: são as desculpas do Estado brasileiro pela maneira como ele, que era legitimamente Presidente, foi afastado do Brasil.

É muito pouco, mas é um gesto.

As novas gerações nem sabem quem foi Jango e o que ele representou para o Brasil, em especial para o Amazonas.

Sinto-me na obrigação, e já fiz isto em outras oportunidades, de resgatar parte desta história.

Nos anos 50 o Amazonas bateu no fundo poço com a quebra definitiva do ciclo da borracha, cuja fase áurea já havia passado há muito, mas que ganhou uma sobrevida com a II Guerra Mundial e o financiamento dos Estados Unidos para a produção dos nossos seringais. Só para se ter uma ideia, relembro dois fatos: o funcionalismo em 1954 ficou nove meses sem receber seus vencimentos e em 1959 ficamos às escuras, sem energia elétrica.

No início dos anos 60 começou uma reação. O funcionalismo já recebia em dias e Manaus voltou a ter energia regular (até melhor do que é hoje).

Em 1962, o então deputado federal Arthur Virgílio Filho, pai do prefeito Arthur Virgílio Neto, apresentou projeto que refundava a Universidade do Amazonas (UFAM) que, depois de ser a primeira universidade brasileira no início do século XX, havia se desfeito e dela só restou a Faculdade de Direito. O projeto foi aprovado, mas obviamente só se consolidaria com a sanção presidencial. O Brasil era parlamentarista, por força de emenda articulada por Tancredo Neves em 1961, a fim de conter as forças que não aceitavam que Jango, eleito vice de Jânio (naquela época votava-se separadamente para Presidente e Vice), assumisse a presidência com a renúncia do titular. Para voltar a existir a nossa universidade era preciso que Tancredo e Jango sancionassem a lei. E eles fizeram isso em 12 de junho de 1962 quando sancionaram a Lei nº 4069-A/62, abaixo:

Só em 1965 a universidade começou a ser implantada. Na foto da sessão solene de instalação que ocorreu no Teatro Amazonas aparece muitos nomes ilustres, mas nela não consta o autor do projeto o saudoso deputado Arthur Virgílio Filho, à época senador. Nos anos seguintes, com todas as dificuldades, a implantação dos novos cursos foi acontecendo graças à dedicação de seus então dirigentes, bem como pela participação de toda a sociedade, que antes se quisesse que seu filho fizesse outro curso que não Direito tinha que mandá-lo estudar fora. E obviamente poucos podiam fazer isso.

Pois bem. A UFAM não teria existido sem o projeto do deputado Arthur, muito menos sem que Tancredo Neves e Jango sancionassem a lei. No entanto, não existe na UFAM, ao menos, uma cantina com o nome de um ou de outro. Em relação ao Dr. Arthur, tardiamente é verdade, ainda houve um resgate quando o Conselho Universitário deu ao Campus o seu nome, mas Tancredo e Jango simplesmente não são sequer conhecidos pela comunidade acadêmica.

Todas as vezes que sou convidado a fazer palestras na UFAM tenho a preocupação de perguntar aos alunos se eles podem me dizer se Jango e Tancredo fizeram alguma coisa pelo Amazonas. A resposta é uma só: NÃO. Ou seja, não temos memória.

No momento em que o Brasil reverencia Jango entendo que a UFAM deveria, também, pedir desculpas pelo nosso esquecimento e prestar as justas e merecidas homenagens a estes dois ilustres brasileiros.