CBA, chega de pedir licença!

Por Alfredo MR Lopes (*) alfredo.lopes@uol.com.br

Quando o superintendente da Suframa, Thomaz Nogueira, assumiu a autarquia, em janeiro de 2012, ele pronunciou o mote auspicioso de sua gestão: “O primeiro passo, diante dos múltiplos desafios que temos, será dialogar com a sociedade já que ela faz parte do desenvolvimento”. A frase espalhou euforia e confiança entre os atores e interlocutores do cotidiano do desenvolvimento, onde as entidades costumam se movimentar. E assim tem sido nos momentos de grandes abalos e tomadas de decisão, um diálogo proativo e fecundo, como na elaboração da Nota Técnica de defesa do modelo ZFM, na discussão das verbas de P&D e outras querelas do dia-a-dia.  A eventual discordância nesse ensaio dialogal e permanente – troca de propostas e proposições em pauta – faz parte do exercício saudável e promissor da Democracia onde ninguém de bom senso, se atribui o monopólio da intuição e definição final de qualquer matéria. E é nesse clima de reciprocidade e discussão que se insere os rumos que precisam ser dados ao CBA, o Centro de Biotecnologia da Amazônia, e seu aguardado e adiado modelo de gestão.

A quem interessa o CBA? Em debate com os empresários, o superintendente Thomaz Nogueira anunciou a iminência de uma solução para o CBA, ponderando mais uma vez a multiplicidade de órgãos e ministérios interessados em apadrinhar a instituição. E que dessa vez a presidente Dilma havia entrado na discussão. Algo muito frequente essa tentativa da paternidade absolutamente equivocada em torno da instituição.  Por que seguir esperando por uma definição que depende de um acerto – que se arrasta e se protela indefinidamente – entre entidades e organismos públicos que não acompanham o cotidiano, expectativas e demandas de uma Amazônia que tem pressa em formular saídas? Que insano impor soluções que recomendam a intocabilidade da floresta e descuidam da inovação em torno do banco genético para gerar mecanismos de oportunidade e produção de matrizes de novos negócios. O CBA, embrião do polo de bioindústria que pode transformar potencialidades naturais em prosperidade social, interessa às novas gerações, aos jovens que vagueiam entre o ócio, o tráfico e a delinquência – a chamada geração nem-nem, multidões de moças e rapazes, que nem trabalham nem estudam, – no beiradão amazônico por absoluta ausência de opções.

No início de agosto, as entidades do setor produtivo, CIEAM/FIEAM,  promoveram um seminário sobre Pioneirismo e o Futuro da economia regional. Empresas locais como a Cupuama, Bombons Finos, Oiram, na área de alimentos com a utilização de insumos e tecnologia regional, da Pentop, tecnologia da informação e Fucapi, na área de ensino e inovação tecnológica, mostraram que é necessário priorizar qualificação técnica, investir em pesquisa e desenvolvimento, tendo em vista agregar valor à indústria existente e à imensidade do potencial de negócios na fruticultura, fitoterápicos, cosméticos, agroindústria de alimentos.  As empresas padecem suporte de inovação tecnológica, de infraestrutura de transporte, energia e comunicação, e apontam a dificuldade de acesso ao crédito. Todas elas contaram com apoio da Fapeam e Finepe.

No debate sobre Bioindústria, onde o CBA foi lembrado e cobrado, com UFAM e CIEAM, o diretor da Embrapa Marcelo Rossi destacou a empresa como instituição geradora de conhecimento e inovação e sua visão estratégica frente aos desafios do futuro. Suas linhas de pesquisa na Amazônia Ocidental são: óleo de palma, guaraná, seringueira, banana, manejos florestais e silvicultura, cupuaçu, mandioca, aquicultura, sistemas agroflorestais, fruticultura, integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), plantas medicinais, grãos e olericultura e fibras vegetais. E biotecnologia para controle de pragas e doenças, propagação de espécies, e melhoramento genético. São 40 anos de estrada e presença em 21 países e respaldo ao bem sucedido agronegócio nacional.

Ao retomar o assunto CBA-Centro de Biotecnologia da Amazônia, no Seminário sobre Pioneirismo e Futuro, o professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), José Alberto Costa Machado, e o presidente do CIEAM, Wilson Périco, reiteraram uma recomendação já encaminhada pela Assembleia Legislativa do Estado, e pelo Conselho de Desenvolvimento do Amazonas CODAM, para estabelecer alternativas urgentes de efetividade funcional do CBA, sugerindo que a Embrapa Amazônia Ocidental assuma sua gestão. Na discussão do planejamento estratégico da Suframa, 2008, já foi sugerida simples transferência do CBA para o âmbito da Embrapa. Périco destacou a necessidade do Amazonas constituir novas matrizes econômicas, embasadas na biodiversidade e nas riquezas da floresta amazônica. “O CBA deve cumprir um papel fundamental neste processo e a Embrapa está anos-luz à frente deste caminho em termos de desenvolvimento. Nada se faz sem capital intelectual. Para você formar pessoas para desenvolver novas matrizes econômicas são necessários, no mínimo, 15 anos. Essas pessoas já existem e estão dentro da Embrapa.”

Chega de pedir licença para decidir o benefício do interesse público. É preciso louvar o trabalho da Suframa, até aqui, em apostar no polo de bioindústria que o CBA, há tempos, deveria propiciar. Foram os recursos pagos pelas empresas,  para as taxas administrativas da Suframa, que propiciaram a maior parcela dos R$ 120 milhões investidos no CBA.  É preciso, também, atentar para a atribuição essencial da autarquia, na gestão do modelo ZFM. Não cabe à Suframa fazer pesquisa e desenvolvimento, apenas estimular e gerir os recursos, como tem feito. Ela não tem especialistas, muito menos experiência no objeto institucional do CBA. E os poucos, contratados precariamente, foram compulsoriamente demitidos. Isso não impede sua presença na instância que deve gerir o CBA, assim como a presença do INPA, cuja atribuição institucional é muito próxima à da Embrapa. O que o modelo ZFM precisa é de novas matrizes econômicas de borracha, genética do guaraná, da mandioca, da s resinas e fibras de uso industrial, tudo aquilo que a Embrapa tem feito com denodo e talento. O CBA é fruto do trabalho local, das verbas aqui recolhidas, da expectativa geral de adensamento e interiorização do Polo Industrial de Manaus, com a utilização dos insumos naturais, essa inesgotável biodiversidade. E disso, os ministérios e seus colaboradores precisam entender um pouco mais e saber que cabe aos atores locais a palavra final. Não é preciso pedir benção apenas reciprocidade, compreensão e resguardo na condução do interesse local e nacional. Afinal, quem aqui vive sabe onde o sapato aperta e o rumo que, nesse banzeiro, a catraia deve tomar.

(*) Alfredo é filósofo e ensaísta