Por que as pessoas choram a morte de um traficante?

Fatos como prisão relâmpago do jovem Raphael Souza, filho do deputado Wallace Souza, e a morte dos supostos traficantes Bebeto e Bebetinho geram indignação em uma parcela da sociedade manauara. Discursos em defesa da garantia de presunção de inocência e direito de imagem afloram por toda parte.

Lembro que a morte do traficante Bebeto da Praça XIV promoveu uma grande comoção entre os moradores do bairro. Seu velório reuniu uma multidão. Não dá pra assistir a isso sem perguntar: Por que as pessoas choram a morte de um traficante?

Num mundo em que o valor das pessoas não está no seu comportamento ético e sim nos bens materiais que detém, parece absolutamente razoável compreender o valor dado a um homem simples que acumulou riquezas e que, sempre que pôde, distribuiu uma migalha dessas riquezas como caridade ou como patrocínio para festas populares.

Para seus admiradores Bebeto não tinha defeitos, não importa se matou ou mandou matar alguém, não importa quantos ele submeteu ao inferno do vício. Ele era um homem bom para os seus amigos e vizinhos.

Se a polícia, a imprensa e muitas autoridades sabiam seu endereço há anos e nada fizeram, não seriam seus vizinhos e amigos a condená-lo.

Quando o Estado fecha seus olhos para o crime, quando a polícia muitas vezes se associa ao crime, quando a caridade do crime conquista o coração de pessoas que o Poder Público ignora, quando os organizadores das festas populares não se importam com a origem do dinheiro que as financiam, quando traficantes, bicheiros e demais contraventores surgem nas páginas de algumas colunas sociais, o errado vira certo, o crime vira caridade, o bandido vira mocinho e as pessoas choram a morte de um traficante.

Nessa inversão de valores é fundamental mostrar que a prisão de Raphael não foi arbitrária, mas fruto de uma ordem judicial de prisão em flagrante por porte ilegal de munição, diferente das muitas arbitrariedades que ele cometeu contra os que chamava de “bandidos”, “galeros” e “marginais”, negando o direito de defesa que hoje reivindica para si.

Construir um novo mundo, com novos valores, exige escolhas, renúncias e riscos. Bebeto não era um homem bom e não merece o choro do nosso povo.

Marcelo Ramos é advogado e vereador pelo PCdoB.

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