Arthur Virgílio Neto

“Caminhos”, de Bernadete Andrade

Tenho dito aos meus filhos, nas reuniões mais íntimas, que não se surpreendam se um dia, de repente, acordarem ricos. É que reuni, levado pela admiração e afinidade, um expressivo acervo da artista plástica Bernadete Andrade, dileta amiga, falecida em 2007, aos 53 anos. Um dia isso valerá muito dinheiro.

Sexta-feira, ao ver uma parte da produção dela, reunida por Oscar Ramos, na exposição “Caminhos”, aberta ao público de ontem ao dia 24 de abril, fiquei com a sensação de que o dia do reconhecimento está mais perto que pensava.

Berna nasceu em Barreirinha, que divide com Maués a população sateré-mawé e é banhada pelo Paraná do Ramos, de águas barrentas, como o rio Amazonas, e, ao mesmo tempo, pelo negro rio Andirá.

Aberta, inteligente, pesquisadora atenta, enveredou de vez pelo caminho da arte quando ingressou na Escola Técnica Federal e manteve contato com o professor de desenho Moacir Andrade, no curso de Edificações.

Passou a estudar desenho artístico na Pinacoteca de Manaus (Biblioteca Pública), onde mergulhou na companhia dos mestres Álvaro Páscoa e Manoel Borges.

Cursou licenciatura, em Educação Artística, na Universidade Federal de Pernambuco, em Recife. E, voltando a Manaus, passou a produzir e a conviver artisticamente, no ambiente da Pinacoteca, com gente como Van Pereira, Auxiliadora Zuazo, Otoni Mesquita, Jair Jacqmont, Arnaldo Garcez e Sérgio Cardoso.

Formada em Filosofia pela Ufam, bacharel em pintura na Escola de Belas Artes, do Rio de Janeiro, em 1988, Berna assumiu a cadeira de História da Arte do curso de Educação Artística, na mesma Ufam. Acumula uma pós-graduação nos Estados Unidos e, em 2004, tornou-se superintendente regional do IPHAN, quando implementou o programa Brasil Patrimônio Cultural, que fez o levantamento de sítios e coleções arqueológicas no Médio Amazonas.

Em “Caminhos”, a alma artística de Bernadete Andrade casa com a do também artista plástico e diretor teatral e cinematográfico Oscar Ramos, numa coleção com 40 obras e diferentes técnicas. Um show de versatilidade.

Li uma declaração de Magela Andrade, irmã, pro-reitora da Ufam, sobre a artista: “Berna resgata em suas telas a história soterrada dos povos tradicionais da Amazônia. Ela também imprime espiritualmente o cenário interiorano de onde nasceu. Há outras obras em que mostra a arquitetura e a história sociopolítica e cultural de Manaus”, enfatiza.

O mundo ainda vai descobrir a contribuição de Bernadete à arte, na mistura de cores e texturas da natureza, grafismos e inovações indígenas, abrindo espaço para o mundo mágico da Amazônia. Manaus mesmo, ainda entenderá o quanto era amada por ela e o tamanho do esforço pessoal envolvido na preservação da memória da cidade.

Um artista é reconhecido pela originalidade e beleza de seu trabalho. Esses dois ingredientes são a própria alma da criação dessa artista, nascida no berço das letras de meu saudoso amigo Aurélio Andrade e dona Alicinha.

Soube que “Caminhos” estava toda preparada, antes mesmo da morte dela, e a família sente-se resgatada com sua execução.
Berna, parabéns. O reconhecimento vem a galope.

PS: Dedico este artigo à minha querida amiga radialista Ivone Andrade.

* O autor é líder do PSDB no Senado Federal.

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