A vulgarização da política

Esta semana, a duras penas, enfrentamos os percalços no caminho da instalação da CPI da Petrobras. Há razões sólidas para isso. Denúncias pipocam de todos os lados, desde o superfaturamento na construção de plataformas, até os super-salários de R$ 76 mil dos “conselheiros” da empresa. E a minoria precisa afirmar o direito de investigar a maioria, princípio basilar das Democracias.

Fiquei chocado com integrantes do colegiado de líderes que tentaram, ao longo das discussões, inclusive em plenário, vulgarizar nosso direito à CPI da Petrobras. Exigiram que eu abra mão da relatoria da CPI das ONGs. Eu abro, até porque já deixei lá contribuição substantiva, a partir mesmo de elementos colhidos antes de mim. Surgiu o pretexto da CPI do DNIT. Nós a extinguiremos, embora existam razões para investigar o órgão. Basta que se respeite o direito da minoria.

Nossa falta de memória histórica ou mesmo de cultura causa estragos.

Em 1894, quando Alfred Dreyfus, inocente, foi condenado à prisão na Ilha do Diabo, na Guiana Francesa, por uma carta a ele atribuída, a França se dividiu. Nascia o “Caso Dreyfus”. Um intelectual, Emile Zola, escreveu “J’accuse!” (Eu acuso!), uma carta endereçada ao presidente francês, Félix Faure, em 13 de Janeiro de 1898, durante a revisão do processo. Dizia: “Como poderias (a França) querer a verdade e a justiça, quando enxovalham a tal ponto todas as tuas virtudes lendárias?”.

Dreyfus, judeu, apesar do antissemitismo francês à época e da resistência de parte da população, venceu.

Isso aconteceu na mesma França em que um único homem, François-Marie Arouet, conhecido como Voltaire, derrubou as intolerâncias, especialmente religiosa e de opinião, da Europa de seu tempo, influenciando toda a humanidade.

Cem anos depois, quando os EUA invadiram o Iraque, André Glucksmann, filósofo e ensaísta francês, e Adam Michnik, intelectual polonês da raiz do Sindicato Solidariedade, apoiaram a iniciativa norte-americana. Jürgen Habermas e Jacques Derrida, dois dos mais famosos filósofos/intelectuais da Europa, publicaram em jornal alemão uma crítica considerando a invasão um “caminho perigoso” e, ao mesmo tempo, alerta e convite para o velho continente repensar a própria identidade, fincada nos valores do Iluminismo. Textos semelhantes foram escritos por Umberto Eco e Gianni Vattimo (Itália), Adolf Muschg (Suíça), Fernando Savater (Espanha) e até pelo norte-americano Richard Rorty.

O resultado? Essa nata da intelectualidade européia, herdeira de Voltaire, Zola e tantos outros, foi solenemente ignorada. Nenhuma comoção. Governos de França, Alemanha, Bélgica e Espanha “viram com bons olhos” as idéias, mas elas não motivaram audiência a essas mentes privilegiadas.

Luto, a cada dia, para evitar que os políticos brasileiros percam a voz. É por isso que falo tanto, da tribuna ou do plenário.

PS: Gilberto Mestrinho está na UTI. Muitos disseram que quando me aliancei a ele cometi um erro. Entre outras coisas, o comportamento digno que teve no Senado, uma voz serena que falta nessa hora de crise, mostra que tive razão. Vim de Brasília para estar ao seu lado. Torço por recuperação rápida, Mestrinho. Boa sorte.

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