Beto Albuquerque avalia os rumos da política após as eleições de 2014

Líder do PSB na Câmara, Beto Albuquerque concorreu à vice-presidência da República. Foto: Sérgio Francês

Aos 51 anos de idade, o líder do Partido Socialista Brasileiro (PSB), deputado federal Beto Albuquerque, encerra, em dezembro, seu quarto mandato consecutivo na Câmara dos Deputados. Antes, porém, de sua primeira posse em Brasília, em 1999, Beto já havia cumprido dois mandatos como deputado estadual no Rio Grande do Sul, seu estado natal.

Já se vão 24 anos de dedicação à construção de uma sociedade mais justa e igualitária, pautado sempre por princípios éticos que valorizem o papel da política. Durante todo este tempo, foi autor e responsável pela aprovação de leis de grande relevância para o povo brasileiro, entre elas, as que aprimoraram o Código de Trânsito Brasileiro e a lei que instituiu, em 2009, a Semana de Mobilização Nacional para Doação de Medula Óssea, comemorada entre os dias 14 e 21 de dezembro. É também de sua autoria a lei que criou o Fundo Nacional do Idoso.

Sua militância política teve sua origem ainda na juventude, quando ocupava os bancos da universidade. Com uma única filiação partidária ao longo de toda a sua vida, fez do PSB sua casa de luta e à consolidação da legenda se dedicou com afinco. Em 2014, após a súbita morte de seu amigo e uma das maiores lideranças e referências políticas do País, o então candidato à Presidência da República Eduardo Campos, Beto assumiu a missão de compor a chapa socialista na disputa pelo Executivo brasileiro, na condição de vice-presidente. Ao lado de Marina Silva, percorreu as 27 unidades da Federação, onde conheceu os problemas de cada região e se dedicou sobremaneira na busca de soluções.

Em entrevista ao Portal do PSB na Câmara, Beto falou sobre essa experiência, sua visão sobre os rumos políticos do Brasil e as tendências para os próximos anos.

O senhor sempre teve uma trajetória política bastante exitosa, com resultados significativos nas urnas a cada pleito disputado. Para as eleições de 2014, o senhor certamente seria reeleito para Câmara dos Deputados com expressiva votação. Entretanto, optou pela candidatura ao Senado e, posteriormente, assumiu a candidatura na chapa majoritária à Presidência da República. O que o levou a abdicar de uma eleição ganha?

Não se trata de abdicar de uma eleição ganha, mesmo porque esse conceito de eleição ganha não existe. O que nos levou a esta decisão foi o fato de que nosso projeto é amplo, voltado para o País, e não meramente para vencer eleições. Nosso partido se consolidou e vem crescendo a cada eleição justamente por se pautar no princípio de construir um Brasil melhor para todos, e não apenas para alguns grupos oportunistas.

Nesta perspectiva fui convidado pelo nosso então candidato à Presidência, Eduardo Campos, para assumir a tarefa de disputar uma vaga ao Senado pelo Rio Grande do Sul. Assumi com afinco essa tarefa. Infelizmente, nossos planos foram subitamente alterados pelo acidente que nos levou Eduardo Campos e tivemos que, num curto período, tomar muitas decisões. Neste novo cenário, o PSB confiou a mim a missão de construir a campanha ao lado de Marina.

Assumimos esse desafio e, em menos de sessenta dias, partimos para a estrada. Neste período, vimos que o Brasil pede um novo ciclo. Um novo ciclo econômico. Um novo ciclo político. Não se pode esperar mais do mesmo.

Infelizmente, o que norteou a campanha não foi o debate sobre o que o Brasil precisa, mas a busca incessante pela desqualificação dos demais candidatos, de forma descarada e mentirosa, por parte da candidata à reeleição. Venceu a política do medo, do terrorismo, de espalhar o terror. Isso não contribuiu em nada para a democracia brasileira.

Quanto à nossa missão, encerrei essa campanha com o sentimento de dever cumprido e muito orgulho de ter representado ao lado de Marina Silva o pensamento de Eduardo Campos e do PSB.

De forma geral, que avaliação o senhor faz das eleições de 2014?

As eleições de 2014 ficaram marcadas na história política brasileira, não pela celebração da democracia, mas pela marca da vitória da mentira e da falta de ética.

Além do uso da máquina pública para fazer campanha, o PT também lançou mão de mentiras contra os adversários e sobre a realidade do País. A campanha do PT chegou a afirmar que as ideias de Marina iriam minar os principais programas sociais. Eu e Marina sofremos as injúrias e calúnias e, depois de fazerem tudo isso conosco, vieram pedir apoio e querer argumentar que, por sermos esquerda, deveríamos estar ao lado deles. Se fosse para apoiarmos a presidente Dilma, não precisávamos ter saído do Governo e nem ter perdido Eduardo Campos voando em campanha.

Tudo isso colocou o debate político em nível rasteiro, algo que nosso País, nosso povo não precisa. Nesse contexto, o Governo fugiu do debate central que deveria ser travado: o da economia. O País está estagnado! A presidente Dilma fechará este ano com índices piores do que aqueles de quando recebeu este País. Se o modelo vigente estivesse dando certo, não estaríamos vivendo a volta da inflação, com furos na previdência, não teríamos 3,5% do PIB em déficit em conta corrente. Nossa economia está refratária, sem crescimento. As contas públicas estão desajustadas! Vemos a todo instante o rebaixamento do grau de potencial de investimento, levando embora recursos importantes para o crescimento do nosso País. Como se não bastasse, o que se vê é a forte oposição no Congresso Nacional e nas ruas.

Durante a campanha eleitoral, a presidente Dilma minimizou o cenário negativo no qual o País se encontra e prometeu corrigir o que estava errado e melhorar o Brasil. O senhor acha que ela conseguirá cumprir suas promessas?

O fato é que Dilma terá que fazer tudo ao contrário do que disse na campanha. E já está fazendo! O novo governo já começará desgastado. Passado o período eleitoral, o governo precisou admitir que convivia há meses com um problema contábil que nem as dezenas de manobras fiscais feitas pelo Tesouro Nacional foram capazes de encobrir. O Governo enviou lei ao Congresso para driblar a meta fiscal e reforça a impressão de que o País apresentado na campanha do PT era apenas uma peça de marketing eleitoral.

É preciso que se faça uma grande limpeza nas nossas empresas estatais, nos ministérios, nas agências reguladoras e até nos poderes, que hoje estão tomados por aparelhamento político.

Os problemas não param por aí. Também temos uma crise que se agrava sistematicamente em relação à nossa matriz energética. O Brasil continua apostando no sistema hídrico, mas não temos porque não avançar na energia solar, no gás. O pior cenário para o Brasil é não ter energia. O governo Dilma colapsou o setor. É preciso explorar outras fontes de energia.

Dilma continuará refém da velha política, dos acordos e conchavos feitos com o único objetivo de manter o poder.

O Governo tem envidado todos os esforços para aprovar o projeto de lei que altera a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014 e permite ao governo flexibilizar a meta de superávit primário das contas do setor público. Como o PSB irá se posicionar diante dessa iniciativa?

Não seremos sócios da irresponsabilidade fiscal do Governo Dilma! As manobras governistas para mudar a Lei no final do ano servem apenas para livrar a governante do crime de improbidade com as contas públicas. Isso não serve ao interesse público e somente demonstra que continuamos no mesmo ciclo que trouxe a inflação de volta e que prejudica todo o País.

Na sua avaliação, qual pauta deverá dominar a política a partir do próximo ano?

A reforma política é, sem dúvida, o principal assunto a ser tratado. O processo eleitoral e o resultado da eleição de 2014 comprovam que precisamos de instrumentos, de mecanismos que garantam a alternância do poder, a renovação dos quadros políticos e das lideranças que governam. Não podemos mais conviver com situações como a vergonhosa prática levada a cabo na gestão da Petrobras.

O mundo mudou. A cultura mudou. O mundo hoje é digital e a política continua analógica. Precisamos de mecanismos que favoreçam o diálogo entre os entes políticos e o povo e que deem mais transparência à gestão pública. Plataformas digitais que se traduzam em mais democracia.

Esperamos, ainda, que se avance na reforma tributária. Precisamos de uma revisão urgente que produza avanços para o País, que reduza a carga tributária em setores importantes, elimine a guerra fiscal entre os Estados e conduza à maior parte da destinação do ICMS ao destino.

O senhor citou o caso da Petrobras. A corrupção parece ter se tornado uma epidemia no Brasil. Como o senhor acredita que esse mal pode ser combatido dentro do Governo?

Um passo importante é não se eleger nem se nomear corrupto. É preciso livrar o estado brasileiro da corrupção, do loteamento de cargos, da apropriação indevida das instituições públicas e também do uso de meios oficiais para caluniar e destruir adversários políticos. A Petrobras está sendo destruída pelo uso político, pelo apadrinhamento e pela corrupção.

Além disso, é preciso ter gestão, planejamento, metas, medição de resultados e, acima de tudo, transparência.

Uma forma de se combater o apadrinhamento, por exemplo, é com a implantação de comitês de busca. Abre-se prazo para candidatura, monta-se uma lista de potenciais candidatos com competência técnica comprovada e, a partir desta lista, se escolhe o mais indicado. Um processo simples, já empregado por vários gestores do PSB, e que dá transparência e lisura à escolha de gestores públicos.

Sobre a reforma política, que propostas o senhor considera fundamentais a serem discutidos?

Precisamos melhorar o sistema político para que possamos estar mais próximos do eleitor, em sintonia com ele. E essa sintonia vem quando o político percebe o que o eleitor deseja que seja feito no âmbito de sua representação parlamentar ou mesmo no Executivo.

O PSB é favorável à ampliação de novos mecanismos de democracia participativa, como o uso do referendo e do plebiscito e a redução do número de assinaturas para projeto de iniciativa popular; o fim do voto secreto em todas as casas legislativas; o fim da reeleição no Executivo e a instituição de um mandato de cinco anos para todos; e o fim das coligações proporcionais.

A mudança do sistema de financiamento público no Brasil, por exemplo, é extremamente importante para diminuir a incidência do poder econômico nas eleições. Neste sentido, precisamos rever questões inerentes ao processo eleitoral como o tempo de televisão. É necessário limitar o tempo de cada partido e o nível de produção dos programas eleitorais. O ideal é que o programa seja apenas o candidato apresentando suas propostas e não megaproduções milionárias que só podem ser bancadas por quem tem mais recursos.

É preciso, ainda, permitir a fiscalização de órgãos da justiça, do Ministério Público, de representantes da sociedade civil, além daquela já realizada pela Justiça Eleitoral.

Gustavo Sousa